Quimioterapia: potencial terapia para reduzir efeitos colaterais
A cisplatina é um medicamento quimioterápico utilizado para o tratamento de vários tipos de cancro, principalmente do pulmão, ovário e testículo. Embora a sua eficácia antitumoral esteja comprovada, a cisplatina promove efeitos colaterais que incluem dor intensa (neuropatia periférica) e danos nos rins, levando à insuficiência renal aguda num terço dos casos.
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Atualmente, não existem soluções eficazes para limitar os efeitos colaterais nos pacientes expostos. Mas uma equipa de cientistas de Lille em colaboração com investigadores da Universidade Estadual do Michigan, nos EUA, identificou uma substância que pode mudar a vida desses pacientes.
A istradefilina, já aprovada nos EUA e no Japão para o tratamento da doença de Parkinson, pode não apenas reduzir os efeitos nocivos da cisplatina, mas também preservar ou mesmo potencializar as suas propriedades antitumorais. Biologicamente, este composto bloqueia os receptores de adenosina na superfície das células.
Um trabalho internacional conduzido por Christelle Cauffiez, David Blum e Geoffroy Laumet já tinha permitido verificar um aumento da densidade desses receptores no cérebro de pacientes com demência, fenómeno envolvido no desenvolvimento dessas doenças. Curiosamente, um aumento comparável de receptores de adenosina também foi observado pela equipa de cientistas nos rins, sob exposição à cisplatina.
Com isto em mente, os especialistas decidiram unir forças com o laboratório de Laumet, especialista em dor neuropática induzida pela cisplatina, para testar o impacto da istradefilina na mitigação dos efeitos nocivos do quimioterápico.
As suas experiências, publicadas no Journal of Clinical Investigation, foram realizadas em modelos animais e em células, e apontaram para um papel benéfico da istradefilina.
Em ratinhos expostos à cisplatina, a molécula não só reduziu os danos renais, como preveniu a dor neuropática. Além disso, a capacidade da cisplatina para reduzir o crescimento do tumor aumentou nos animais que receberam a istradefilina – um efeito posteriormente confirmado em modelos celulares.
Segundo os cientistas, antes de se considerar a ampla aplicação desta abordagem terapêutica em pacientes com cancro, as descobertas devem ser consolidadas com a realização de um rigoroso ensaio clínico. Mas o facto de a istradefilina já ser utilizada em humanos para tratar outra doença constitui uma perspetiva interessante.
Na verdade, já existem muitos dados clínicos que revelam que a molécula é segura. Embora seja necessário realizar um ensaio clínico para testar a sua eficácia na redução dos efeitos colaterais da quimioterapia, a possibilidade de reposicionamento terapêutico é uma perspetiva promissora para melhorar o atendimento aos pacientes a curto prazo.