Nos países mais desenvolvidos, cerca de 30% da população é afectada por toxinfecções alimentares anualmente.
Sendo mais frequentes no Verão, as toxinfecções alimentares, além de poderem estragar um belo dia de praia, podem ter consequências sérias para a saúde. Deste modo, e como em tudo, prevenir é o melhor remédio.
A maioria dos alimentos que ingerimos contém microorganismos – como por exemplo os fungos, que servem para fermentar algumas bebidas –, sendo muitos deles indispensáveis ao regular funcionamento do aparelho digestivo. Por exemplo, na flora intestinal coexistem bactérias que mantêm uma relação amistosa com o intestino, produzindo as vitaminas K e B12, riboflavina e tiamina em troca de "alojamento e alimento".
Algumas daquelas bactérias ajudam na decomposição da matéria orgânica e evitam a multiplicaç ão de alguns agentes patogénicos causadores de doenças.
Porém, por vezes, os alimentos, quer os de origem vegetal, quer os de origem animal, incluindo as bebidas, podem transportar, para além dos vários microorganismos essenciais, agentes patogénicos – bactérias, vírus ou fungos –, que poderão causar problemas de saúde.
Os alimentos podem ser contaminados directamente, através do contacto com insectos, ratos ou baratas ou através dos seres humanos.
Nos seres humanos proliferam agentes patogénicos e, como tal, podem potenciar transmissões bacterianas se não existirem os necessários cuidados. Uma lavagem deficiente dos instrumentos de cozinha, da bancada e, principalmente, das mãos podem tornar-se numa fonte de contaminação e transmissão bacteriana.
A gravidade da toxinfecção depende de vários factores, tais como, do grau de contaminação do alimento, da quantidade ingerida, do tipo de agente patogénico e da capacidade de resistência do sistema imunológico de cada indivíduo. Os grupos mais vulneráveis são as crianças até aos 4 anos, os idosos, as grávidas, os doentes e os imunodeprimidos. O grupo das bactérias, devido à sua grande diversidade e patogenia, é o grande responsável pela transmissão da maioria das doenças.
O quadro sintomatológico da pessoa que sofre de uma toxinfecção alimentar caracteriza-se por uma série de transtornos gástricos, entre eles os vómitos, a diarreia, febre e dores abdominais, que podem ocorrer separadamente ou em simultâneo, de acordo com as características da bactéria.
Existem espécies bacterianas que são destruídas pela cozedura correcta dos alimentos ou pela sua pasteurização. Estas espécies caracterizam-se por não terem esporos e por serem responsáveis pela generalidade das infecções alimentares. Pertencem a este grupo a campylobacter, a salmonella, a shigella, a yersinia, a vibrio, a brucella, a clostridium e a listeria.
Já as espécies bacterianas com esporos altamente resistentes ao calor, podem produzir poderosas toxinas. Neste caso as doenças são causadas pela ingestão de alimentos contaminados com estas toxinas, designadas por exotoxinas. Deste modo, a bactéria passa a ser um agente patogénico secundário, sendo a toxina a responsável pela doença. Estas espécies bacterianas são as responsáveis pelas intoxicações alimentares.
Pertencem a este grupo a Staphylococcus aureus, a clostridium botulinum e a Bacillus cereus.
Existe uma diferença significativa entre a infecção e a intoxicação alimentar. A infecção alimentar é causada por bactérias que se desenvolvem no tracto intestinal e a partir daí invadem os tecidos ou fluídos orgânicos produzindo toxinas, designadas por enterotoxinas.
Já a intoxicação alimentar é provocada pela ingestão de alimentos contaminados por substâncias tóxicas. Esta pode ser causada pela degradação do próprio alimento, provocada por microorganismos ou por químicos.
De todas as bactérias, a que detém o recorde de ter provocado mais infecções é a campylobacter, encontrada nas aves, no leite não pasteurizado, na carne vermelha e na água não potável.
Esta bactéria, da espécie C. Jejuni é responsável pelas enterites agudas. Este tipo de bactérias caracteriza-se por bastonetes espiralados, não esporulados, móveis por um único flagelo polar, Gram negativos e microaerofílicos. Esta bactéria manifesta-se, normalmente, 2 a 10 dias após a ingestão de alimentos mal cozidos, nomeadamente carne, e a sintomatologia associada é a diarreia, cólicas e febre.
O segundo lugar do pódio pertence à Salmonella. Esta pertence à família das Enterobacteriaciae e caracteriza-se por bastonetes de 0,5 a 0,7 microns por 1 a 3 microns, móveis por flagelos peritríquios, não esporulados, Gram negativos e anaeróbios facultativos.
Nas espécies mais importantes está incluído o agente da febre tifóide. O quadro sintomatológico inclui diarreia, dores abdominais, febre e vómitos. O indivíduo pode ficar contaminado ao ingerir leite não pasteurizado, ovos e derivados de alimentos crus, carne, aves e fezes de humanos e de animais.
Na Escherichia está incluída uma única espécie bacteriana, a E. coli. Esta apresenta-se com células em forma de bastonetes rectos, móveis por flagelos peritríqueos ou imóveis, não esporulados, Gram negativos e anaeróbios facultativos. Esta habita normalmente no intestino humano e no dos animais, tendo uma acção nociva apenas em algumas situações particulares.
O aparecimento dos sintomas – diarreias, febre e náuseas – surge normalmente entre 6 a 36 horas após a ingestão de carne e hambúrgueres mal cozinhados.
As espécies da shigella, caracterizada por bastonetes de 0,4 a 0,6 microns por 1 a 3 microns, imóveis, não esporulados, Gram negativos e anaeróbios facultativos, causam disenteria bacilar 1 a 3 dias após a ingestão de alimentos contaminados, tais como charcutaria, cremes e molhos pré-cozinhados e marisco mal cozido, sendo os sintomas mais frequentes a diarreia e fezes com sangue e muco.
A yersinia caracteriza-se por bastonetes, Gram negativos e não esporulados, destacando-se a espécie Y. Os sintomas manisfestam-se 16 a 48 horas depois da refeição e a pessoa sofrerá de dores abdominais, náuseas, diarreia e vómitos.
A vibri é da família da Vibrionaceae. Esta família tem, entre outras, duas espécies prejudicais, a V. cholerae, responsável pela cólera e a V. parahaemoliticus, responsável pelas infecções alimentares provocadas pela ingestão de peixe, moluscos e crustáceos mal cozinhados. Tem bastonetes encurvados, móveis por um único flagelo polar, não esporulados, Gram negativos e anaeróbios facultativos. Os sintomas, que deverão surgir cerca de 12 a 18 horas depois, são a desidratação provocada por diarreias excessivas, dores abdominais, vómitos e febre.
A brucella é caracterizada por pequenos cocobacilos de 0,4 a 0,6 microns por 1,5 microns, imóveis, não esporulados, Gram negativos e aeróbios. As três espécies que são nocivas ao ser humano e animais são a B. abortus (bovinos), a B. melitensis (caprinos) e a B. suis (suínos). Este tipo de infecção pode ser provocada pela ingestão de lacticínios de animais infectados. O tempo de incubação desta bactéria é de 5 a 30 dias e provoca cefaleias, calafrios e febre ondulante.
A espécie de Clostridium incluí-da neste grupo é a C. perfringens, ou C. welchii, que produz uma enterotoxina sensível ao calor. O tempo de incubação é de 8 a 20 horas e os sintomas são as diarreias, dores abdominais e náuseas. Este tipo de infecção advém do consumo de grandes peças de carne mal passada ou carne pré-cozinhada que não tenha sido submetida ao processo de congelação.
No género listeria, encontra-se a listeria monocytogene, fonte de grandes infecções, tais como as listerioses. Caracteriza-se por bastonetes curtos, regulares, não esporulados, móveis por flagelos peritríquios, Gram positivos e anaeróbios facultativos. Esta bactéria atinge particularmente recém-nascidos e idosos, sendo os sintomas semelhantes aos da meningite. Uma infecção deste tipo é provocada pela ingestão de carnes frescas, leite cru ou não pasteurizado.
Os grupos microbianos responsáveis pelas intoxicações alimentares são as que a seguir se descrevem:
– O Staphylococcus aureus é uma espécie que se caracteriza por células de forma esférica, que formam arranjos irregulares, imóveis, não esporulados, Gram positivos e anaeróbios facultativos. Os sintomas surgem cerca de 2 a 6 horas depois de o indivíduo ingerir carne pré-cozinhada, cremes e maioneses contaminadas.
– As células do bacillus cereus têm a forma de bastonetes móveis, esporulados, Gram positivos e anaeróbios facultativos. Esta é uma bactéria polivalente, pois pode produzir dois tipos de toxinas de acordo com a especificidade da estirpe: termorresistente (exotoxina) e termolábel (enterotoxina).
Os sintomas que denunciam a intoxicação são os vómitos, diarreias e dores abdominais e manifestam-se 1 a 5 horas após a ingestão de produtos de origem vegetal e animal incluindo a carne.
Os sintomas que denunciam a infecção são a diarreia e cólicas, e manifestam-se 1 a 5 horas depois da sua ingestão.
– Por último a Clostridium botulinum, a bactéria que provoca o botulismo, a mais perigosa das intoxicações alimentares, vitimando cerca de 30% das pessoas contaminadas por esta toxina. É constituída por células com a forma de bastonetes, isolados, aos pares ou em cadeia, móveis por meio de flagelos peritríquios, esporulados, Gram positivos e anaeróbios estritos.
O quadro sintomatológico das pessoas contaminadas é a ptose, diplopia, paralisia, vómitos e diarreia, que advêm da ingestão de conservas caseiras, presuntos e enchidos de carne caseiros, pois a temperatura a que se mantêm não é suficiente para destruir os esporos da bactéria. É uma doença de evolução rápida, sendo que os primeiros sintomas se manifestam 18 a 36 horas depois da ingestão dos alimentos contaminados, podendo a pessoa vir a falecer um dia após essa mesma ingestão.
Relativamente às intoxicações de origem química, essas derivam do consumo de alimentos contaminados por substâncias tóxicas de origem química, como materiais pesados ou dioxinas e podem trazer consequências graves e provocar doenças neurológicas e oncológicas, entre outras.
Há também infecções provocadas por micotoxinas, metabolitos tóxicos produzidos por fungos. A produção destes metabolitos é assegurada pelas espécies Aspergillus, Penicillium e Fusarium.
Também os protozoários, nomeadamente o Entamoeba histolytica, Giardia lamblia, G. intestinalis e o Cryptosporidium parvum são capazes de contaminar alimentos e provocar infecções alimentares e, neste caso, estas infecções têm um quadro sintomatológico semelhante ao da bactéria shigella.
Em Portugal, desde há alguns anos que a Direcção-Geral de Saúde (DGS) afirma que os casos de intoxicações alimentares estão subavaliados.
De acordo com o Dr. Pereira Miguel, director-geral de Saúde e Alto Comissário da Saúde, até 2001, os médicos apenas reportavam os casos de toxinfecções alimentares porque era obrigatório, mas não relacionavam os casos entre si e, consequentemente, não se descobriam quais os agentes transmissores. Porém, a partir de Outubro desse mesmo ano, a DGS estabeleceu que os médicos deviam reportar os casos que se relacionavam entre si.
Após análise dos dados referentes a 2002 e 2003, verificou-se um aumento do número de pessoas que sofreram infecções provocadas pela salmonela.
Antes de concluirmos, deixamos algumas recomendações aos consumidores para que se possam tornar um alvo difícil para estes microorganismos patogénicos.
Em primeiro lugar, antes de consumir os alimentos é importante verificar sempre o seu prazo de validade.
Quando comprar carne, esta deve ter um bom aspecto, ter o seu cheiro característico e deverá apresentar uma cor homogénea. Quando comprar peixe, este deverá ter olhos brilhantes, guelras encarnadas, ter o seu cheiro característico e as escamas devem aderir à pele.
Na compra de ovos, verifique se estão carimbados, limpos e perfeitos.
Relativamente aos produtos congelados, estes terão de estar sempre hirtos e duros e deverá transportá-los num saco térmico no percurso até casa.
Ao guardar os alimentos no frigorífico, separe-os dos já confeccionados. Estes alimentos previamente confeccionados, devem ser fervidos durante 10 minutos antes da sua ingestão, para destruir bactérias.
No Verão, devem evitar-se as refeições com maionese, mousses e outras comidas que recorram ao uso de ovos crus ou mal passados, pois este tipo de alimentos degrada-se facilmente com o calor.
Lave muito bem a fruta e, fundamentalmente, lave sempre as mãos depois de ir à casa de banho e antes de começar a confecção de uma refeição, bem como a bancada onde a vai preparar.
Coloque as esponjas da cozinha no microondas durante 1 minuto ou lave-as com produtos antibacterianos, a fim de as desinfectar.
O balde do lixo é uma fonte de bactérias, por isso, deve lavá-lo e desinfectá-lo frequentemente.
É preciso realçar que a maior parte das toxinfecções passa, ao fim de alguns dias, não necessitando da consulta de um especialista, porém, nos casos mais graves, os médicos costumam receitar antibióticos.
É necessária a ingestão de água, soluções re-hidratantes ou sumos de frutas diluídos, água com sal e açúcar ou chá doce e fraco, devido à desidratação provocada pela diarreia, mas se os sintomas persistirem deverá consultar um médico.
A vacinação continua a ser o melhor meio de proteção contra o vírus, com uma proteção mais eficaz contra doenças mais graves, embora o seu efeito protetor diminua com o passar do tempo.
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