LOMBRIGAS (ASCARIDÍASE)

LOMBRIGAS (ASCARIDÍASE)

DOENÇAS E TRATAMENTOS

  Tupam Editores

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De entre os vários vermes intestinais, parasitas que se alojam no intestino humano para se alimentar e reproduzir, destacam-se as espécies ascaris e oxiúros, que embora não sendo perigosos, são muito irritantes podendo causar vários sintomas nada agradáveis como prurido, dor de estômago e mesmo debilitar gravemente a saúde.

A espécie ascaris lumbricoides cujos indivíduos são popularmente conhecidos como lombrigas, é um verme nematoide que se instala e parasita o intestino através da ingestão dos ovos infetantes presentes na água ou alimentos, particularmente em locais de higiene precária, e ali se desenvolve, sendo responsável pela ocorrência de parasitoses designadas por ascaridíase.

Os vermes, como as lombrigas intestinais (oxiúro ou enterobius vermicularis), originam as parasitoses, muito comuns nas crianças em idade pré-escolar e escolar que embora não causem grandes danos, é importante que sejam identificadas para que possam ser curadas por completo mediante tratamento farmacológico antiparasitário adequado.

As lombrigas intestinais são parasitas brancos e muito finos que habitam nos intestinos e a infeção é adquirida quando são ingeridos de forma involuntária os seus ovos microscópicos, que podem estar nas mãos das pessoas infetadas, sobretudo nas unhas, e nos objetos que tenham sido tocados com elas. Para detetar estes parasitas nas crianças é importante permanecer atento se a criança apresentar alguns dos sintomas como comichão anal intensa, emagrecimento, irritabilidade, dificuldade em dormir ou, em casos mais graves, convulsões.

Os primeiros registos

As sociedades incas que ocuparam a América do Sul no século XIII, as populações japonesas de 400 a.C. e até mesmo as múmias egípcias com mais de 2.700 anos, já apresentavam sinais de doenças e infeções provocadas por parasitas. Como o próprio nome indica, estes animais dependem de outros organismos para viver e afligem a Humanidade desde os tempos mais remotos.

Os primeiros registos de doenças causadas por vermes parasitários, ou helmintas, encontram-se no Papiro de Ebers, de 1500 a.C. – um dos tratados médicos mais antigos e importantes que se conhecem –, em que se podem ver descrições de ténias e lombrigas, estas últimas de incidência cosmopolita.

Os ascaris são vermes longos dioicos que apresentam dimorfismo sexual. As fêmeas são maiores e mais volumosas atingindo cerca de 30 a 40 cm de comprimento e os machos entre 15 a 20 cm. O corpo é revestido por uma fina cutícula esbranquiçada, sendo a cavidade interna do corpo denominada pseudoceloma, por não apresentar revestimento endotelial e ser preenchida pelo líquido celómico, que está envolvido nas trocas gasosas e transporte de nutrientes, além de funcionar como um esqueleto hidrostático.

A ascaridíase é a mais frequente das verminoses humanas, e a décima sétima causa mundial de morte. Está disseminada por todo o mundo sendo, no entanto, mais frequente em zonas quentes com condições sanitárias deficientes.

A infeção do homem, hospedeiro do parasita, ocorre na maioria dos países, com uma estimativa mundial de 1,5 mil milhões de ocorrências, sendo responsável por diferentes graus de desnutrição, deficiência cognitiva, complicações e, ocasionalmente, morte nas crianças mais frágeis atingidas.

Apesar de ser um dos parasitas mais frequentes e conhecidos, a maioria das pessoas desconhece que é portadora de lombrigas, isto porque muitas infeções são assintomáticas ou com sintomas digestivos inespecíficos.

A contaminação ocorre quando há ingestão dos ovos infetados do parasita, que se podem encontrar no solo, água ou alimentos (frutas e verduras) contaminados por fezes humanas.

As crianças são as mais vulneráveis à infeção – 70 a 90 por cento dos casos na faixa etária de 1 a 10 anos – devido ao hábito de brincar no chão e à falta de práticas higiénicas adequadas. Geralmente ocorre a ingestão de vários ovos, o que explica a presença de mais que um verme no intestino dos parasitados.

O ciclo biológico do a. lumbricoides

O ciclo biológico do ascaris lumbricoides é do tipo monoxénico, ou seja, possui um único hospedeiro. Os ovos ganham o meio externo através das fezes e uma vez em ambiente favorável (temperatura de 25-30° C, humidade e oxigénio) tornam-se embrionados e evoluem da forma rabditoide para a forma infetante, em cerca de 21 dias, tudo isto no interior do ovo. A forma infetante do parasita pode permanecer inerte durante meses no solo, até ser ingerida.

Após a ingestão, os ovos passam pelo estômago e eclodem no intestino delgado, onde cada ovo se rompe libertando uma larva. Cada larva penetra no revestimento intestinal e entra na corrente sanguínea, atingindo o fígado, coração e pulmões. Uma vez nos pulmões, as larvas realizam a conhecida fase pulmonar – chamada de ciclo de Looss – onde passam pela última transformação antes de se tornarem adultas.

Nos alvéolos pulmonares podem causar sintomas semelhantes aos da pneumonia. Ao abandoná-los transitam para os brônquios, traqueia, laringe (provocando tosse devido a esses movimentos) e faringe. Em seguida, são deglutidas e atingem o intestino delgado, onde crescem e se transformam em vermes adultos (macho ou fêmea).

Após o acasalamento, a fêmea inicia a libertação dos ovos – cerca de 15 mil por dia. Todo o ciclo, iniciado com a ingestão dos ovos, até à formação de adultos, tem a duração de cerca de 2 meses.

Os ovos são eliminados com as fezes. No interior de cada ovo, dotado de casca protetora, ocorre o desenvolvimento de um embrião que, após algum tempo, origina uma larva. Decorridas três semanas o ovo passa a ter capacidade infecciosa que, devido a grande resistência às diferentes condições climáticas, se vai manter durante meses.

Os ovos contidos nas fezes vão contaminar os frutos e vegetais bem como as mãos de quem os manuseia. Estes manipuladores infetados podem ainda contaminar uma grande variedade de alimentos. Dependendo da carga parasitária e das condições do hospedeiro, a ação causada pelos vermes adultos de ascaris lumbricoides é variável.

Manifestações clínicas

Os sinais e sintomas da ascaridíase variam de acordo com o ciclo biológico do verme. A fase de invasão larvar é geralmente assintomática, mas quando se verifica uma elevada carga de larvas pode causar hepatomegalia e, mais raramente, icterícia.

Durante a passagem das larvas pelos pulmões ocorre eosinofilia pulmonar aguda (síndrome de Loeffler), que se caracteriza por um quadro respiratório de intensidade variável no qual estão presentes sintomas como tosse, dispneia, sibilos e dor retrosternal.

Quando se dá a maturação das larvas no tubo digestivo e estão presentes vermes adultos, a sintomatologia é inespecífica e variada. Nestes casos o indivíduo infetado pode apresentar anorexia, dor ou distensão abdominais, cólicas, náuseas, vómitos, diarreia e, por vezes, má-absorção que pode ocasionar desnutrição e deficits cognitivos nas crianças.

Os vermes adultos de ascaris em grande número podem provocar a oclusão do intestino a partir da compactação e formação de um "bolo de ascaris". Podem ainda causar volvos (retorção do intestino) e intussusceção intestinal (intrusão de uma porção do intestino em outro adjacente).

O verme adulto apresenta grande mobilidade, que acaba por ser responsável pela sua presença em locais incomuns ao parasitismo: apêndice cecal, divertículo de Meckel, vias biliares e ducto pancreático (relacionado com a pancreatite aguda). O seu elevado grau de mobilidade está relacionado, também, com um quadro de perfuração intestinal, seguida de peritonite.

Quando estes parasitas adultos se fixam no estômago em número elevado, podem ser regurgitados e aspirados pelas vias respiratórias podendo causar obstrução da árvore traqueobrônquica e consequente insuficiência respiratória (mais comum em crianças).

O quadro clínico por si só não distingue a ascaridíase de outras verminoses, havendo, portanto, necessidade de confirmação da presença de ovos em exames parasitológicos.

Diagnóstico e tratamento

Quando se suspeita da existência de ascaris deve-se consultar o médico para que este confirme o diagnóstico e institua o tratamento adequado, evitando a propagação da doença e prevenindo o aparecimento de complicações.

O exame parasitológico das fezes constitui a melhor maneira de estabelecer o diagnóstico. As técnicas mais indicadas para a realização deste exame são as de sedimentação como Lutz, Kato-Katz e Faust devido ao facto de os ovos de ascaris serem pesados. Devem ser recolhidas 3 amostras de dias alternados.

A análise do hemograma demonstra eosinoflia frequente na fase de invasão das larvas. Em pacientes com grande carga parasitária pode estar presente anemia hipocrómica e microcítica.

Em caso de suspeita de parasitismo apenas por machos, uma outra opção é a realização de radiografia abdominal por contraste. A radiografia simples do abdómen, com o paciente de pé, pode também ser um poderoso aliado no diagnóstico do parasitismo em quadros de oclusão intestinal, por revelar distensão das alças intestinais.

A radiografia do tórax é um exame igualmente útil por poder revelar a presença de larvas no parênquima pulmonar devido à presença de infiltrados intersticiais e mistos nos pacientes com sintomatologia respiratória.

Uma vez estabelecido o diagnóstico, o tratamento da ascaridíase é, atualmente, muito simples, tendo em conta que existem medicamentos antiparasitários bastante eficazes.

De entre os fármacos mais utilizados destaca-se a piperazina. Esta substância provoca a paralisia neuromuscular dos vermes que são, consequentemente, eliminados pelo peristaltismo do intestino. A posologia recomendada é de 75 mg/kg/dia, durante cinco a sete dias. É o medicamento mais adequado nos casos de obstrução intestinal ou em parasitismo elevado, estando no entanto contraindicado na gravidez e insuficiência renal.

O tetramizole/levamizole exerce ação paralisante sobre o sistema muscular do parasita. O tratamento é ministrado em doses únicas, com a posologia de 80 mg para as crianças e 150 mg para os adultos. De salientar que o levamizole possui menos efeitos colaterais mas é contraindicado na gestação e em pacientes transplantados.

O pamoato de pirantel age sobre o parasita causando paralisia espástica por inibição da colinesterase. Via de administração oral, em dose única de 10 mg/kg. A substância está contraindicada na gravidez e na disfunção hepática.

Apesar de a ivermectina – em dose oral única de 200 mg/kg – apresentar uma eficácia de cura de 100 por cento, desconhecem-se os seus efeitos colaterais a prazo.

O tratamento medicamentoso deve evitar substâncias que causam a morte do parasita de forma lenta, uma vez que podem ocorrer complicações relacionadas com a mobilização dos vermes.

Assim, substâncias como o mebendazole e o albendazole, que atuam sobre a captação de glicose e síntese de tubulina, pelo verme – ainda que sejam eficazes –, não devem ser a primeira opção de tratamento.

Apesar de uma dose única ou toma dos medicamentos durante alguns dias ser suficiente para matar os vermes – que pouco tempo depois são eliminados através das fezes –, por vezes convém fazer nova administração passado um ou dois meses, de modo a garantir a eliminação de todos os parasitas que, eventualmente, possam ter chegado ao tubo digestivo durante o período de tratamento.

O uso sistemático de fármacos anti-helmínticos é altamente eficaz no tratamento das infeções sendo, contudo, obrigatória a associação de outras medidas capazes de quebrar o ciclo de auto-infeção.

Tratamentos caseiros

O tratamento das verminoses pode ser feito com medicamentos de venda livre disponíveis em farmácias ou parafarmácias ou sob receita de médica. Porém, alguns produtos naturais possuem a capacidade de alterar o ph do meio intestinal e assim inviabilizar a proliferação dos vermes, tais como:

Leite com hortelã – Rica em substâncias digestivas, a hortelã altera o ph do sistema gastrointestinal inviabilizando a permanência de vermes. Embora não seja confirmado cientificamente, crê-se que o leite aromatizado com hortelã seja o remédio caseiro mais eficaz para o tratamento das lombrigas.

Usar 4 caules de hortelã, 10 folhas de hortelã, 1 colher de sopa de mel e 250 ml de leite desnatado. Ferver os ingredientes durante 10 minutos, sendo importante que se mantenha em lume brando e mexendo com frequência. Deixar arrefecer cerca de 15 minutos e juntar uma colher de sopa de mel. Tomar a preparação morna, em jejum, e esperar uma hora até ingerir qualquer tipo de alimento, de forma a potenciar a sua ação. Repetir o procedimento, preparando uma segunda dose cinco a sete dias mais tarde e ingerir novamente em jejum.

Esta preparação é igualmente eficaz contra ténias e outros parasitas do intestino, pois a hortelã é um excelente vermífugo. Outra preparação também contendo hortelã é um infusão simples desta erva com dois dentes de alho, que deve ser tomado duas vezes ao dia durante uma semana.

Pasta de alho – Rico em alicina, o alho tem capacidade para destruir os ovos dos vermes.

Amassar 10 dentes de alho até formar uma pasta e guardá-la no frigorífico em recipiente tamponado. Misturar 1 colher de chá de pasta num copo de água e tomar todas as noites antes de deitar, durante 7 dias.

Hamamélis – Outro tratamento natural para as lombrigas é aplicar óleo essencial de hamamélis ao redor do ânus, depois de tomar um banho.

Chás – O chá com substâncias digestivas como a erva-santa-maria e o de cáscara sagrada também apresentam efeitos que ajudam a eliminar os vermes intestinais. No entanto, o melhor remédio caseiro para as lombrigas é sem duvida a prevenção, para isso deve-se comer um dente de alho cru, pelo menos uma vez por semana.

Profilaxia para quebrar o ciclo de infeção

A prevenção da ascaridíase está fundamentada no controle da transmissão dos ovos do parasita e inclui medidas de higiene pessoal, educação sanitária, melhoria das condições de saneamento da população e o tratamento adequado dos doentes.

Devido às características de propagação da parasitose, a lavagem das mãos após a evacuação e antes de alimentar-se, bem como a manutenção das unhas curtas e limpas constituem as medidas de higiene pessoais mais destacáveis.

Medidas como o tratamento das redes de esgotos e das instalações sanitárias, bem como a identificação e o tratamento dos indivíduos portadores de ascaridíase são também necessárias para a prevenção da helmintose.

O acesso universal à educação facilita a compreensão da necessidade de tratamento da água para consumo e do destino adequado para as fezes humanas. A população sem acesso à água tratada, deve ferver ou filtrar a água a ser consumida ou utilizada na lavagem de vegetais crus, principalmente dos que estiveram em contacto com o solo.

É igualmente importante um correto armazenamento dos alimentos. Estes devem ser protegidos de poeira e de animais, que podem transportar os ovos mecanicamente.

Todas estas medidas devem ser aplicadas em conjunto. De nada adianta tratar os doentes se no local onde habitam não houver redes de água potável e saneamento básico, ou não possuírem hábitos de higiene corretos, por exemplo. A população envolvida irá infetar-se novamente enquanto houver alguma fonte de contaminação.

Por se tratar de um importante problema de saúde pública, a profilaxia desta e de outras helmintoses, requer uma mudança de comportamento de saúde por parte de todos.

Autor:
Tupam Editores

Última revisão:
09 de Abril de 2024

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