Estudo mostra alterações nas sinapses cerebrais na esquizofrenia
Um novo estudo realizado por uma equipa de cientistas do Instituto de Psiquiatria do King’s College e do Imperial College em Londres, no Reino Unido, com a participação do médico psiquiatra e investigador Tiago Reis Marques, revela que o cérebro de doentes com esquizofrenia apresenta um menor número de sinapses, as zonas de comunicação entre dois neurónios e através dos quais os impulsos nervosos passam de um neurónio para outro.
DOENÇAS E TRATAMENTOS
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O estudo foi aceite para publicação na revista científica Nature Communications, uma das mais importantes revistas científicas mundiais.
Os investigadores conseguiram confirmar, pela primeira vez, estas alterações in vivo, através do recurso à técnica avançada de imagem PET (Tomografia de Emissão de Positrões).
“A proteína SV2A é uma proteína-chave que está presente em todas as sinapses cerebrais. Ou seja, é um marcador das sinapses cerebrais. O que desenvolvemos foi um radiomarcador (uma substância radioativa) que se liga a essa proteína e que permite visualizá-la com recurso à PET”, explica Tiago Reis Marques.
O ponto de partida foi, acrescenta, “perceber se existia alguma alteração nas sinapses cerebrais nesta doença, se existia alguma redução do seu número. Nós já tínhamos algumas pistas que este era o caso, partindo de dados de autópsias de cérebros de pessoas com esquizofrenia, mas não tínhamos forma de o ver in vivo. Daí termos escolhido esta proteína, que é um ótimo marcador das sinapses cerebrais”.
O estudo, de que o especialista português foi coautor, descobriu que o cérebro das pessoas com esquizofrenia apresenta níveis mais baixos da proteína SV2A, do que o cérebro das pessoas sem a patologia.
“Em primeiro lugar, permite-nos compreender melhor a neurobiologia da doença, ou seja, o que se passa no cérebro de doentes com esta doença mental. A esquizofrenia é uma doença complexa e das que menos se sabe sobre as suas causas e estes resultados permitem-nos compreender melhor os mecanismos a ela associados”, explica o investigador nacional.
“Ter uma nova ferramenta que permite caracterizar a distribuição dos cerca de 100 triliões de sinapses que existem no cérebro humano e perceber a diferença na sua distribuição e número representa um avanço significativo na compreensão desta doença”, acrescenta.
Tiago Reis Marques refere ainda que, “ao descobrir-se que existe uma redução desta proteína, mostramos também uma possível nova área terapêutica. O desenvolvimento de fármacos que consigam atuar sobre esta proteína e, de alguma forma, restaurar a função sináptica, pode constituir no futuro uma nova área terapêutica”.
Há mais de 60 anos que não surge um fármaco com um novo mecanismo de ação para o tratamento desta doença.
A investigação promete continuar, garante, e os próximos passos vão no sentido de perceber quando é que esta redução acontece, ou seja, “se é um mecanismo primário, que ocorre logo no início da doença ou mesmo se precede o início desta. Para isso, vamos estudar pessoas em risco e doentes logo no início da sua doença. É um novo campo de investigação sobre o qual, de certeza, muitos outros grupos de investigação em todo o mundo se vão debruçar na sequência do nosso estudo”.
A esquizofrenia é uma doença mental grave que afeta aproximadamente um por cento da população. Esta é uma das mais complexas e graves doenças cerebrais, e os mecanismos cerebrais subjacentes à doença são ainda pouco conhecidos.
“Sabe-se que menos de 70 por cento dos doentes respondem aos tratamentos atuais, e só dez por cento responde totalmente, sendo que a maioria dos doentes, apesar de responderem parcialmente à medicação, continuam ainda a apresentar sintomas”, refere o médico, que confirma que “desde a descoberta, nos anos 50, dos primeiros antipsicóticos, nunca mais surgiu um medicamento com um novo mecanismo de ação. São 60 anos sem descobrir novas formas de tratar a doença e qualquer investigação que permita avançar com possíveis novas formas de a tratar constitui um grande avanço na compreensão da esquizofrenia”.