MASTURBAÇÃO

MASTURBAÇÃO

SEXUALIDADE E FERTILIDADE

  Tupam Editores

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É possivelmente o tabu mais antigo da história! Sempre cercada de preconceitos, e muitas vezes interpretada como ato pecaminoso ou capaz de fazer mal à saúde, a masturbação – durante séculos denominada por onanismo – é, atualmente, considerada uma prática natural, importante para o conhecimento do próprio corpo e para o desenvolvimento da sexualidade. Não obstante, permanece um tema do qual se fala baixinho e se guarda segredo.

Um segredo

Falar de masturbação continua a provocar constrangimentos. Apesar de bem informados, homens e mulheres não falam do assunto sem embaraço, seja na intimidade da sua relação com os companheiros ou na educação dos seus filhos. Abordar assuntos relacionados com sexo ainda é difícil para a maioria das pessoas – e a masturbação é um dos temas que mais inibições provoca. Para melhor se entender o porquê dessas razões convém, antes de mais, definir o significado da prática.

Não é um termo fácil de conceituar. Segundo o psicólogo Juan Carlos Kusnetzof a masturbação pode ser entendida como uma excitação, habitualmente rítmica, efetuada com as mãos, na zona genital, própria, ou do parceiro, com ou sem orgasmo. Já o médico William Howell Masters e a psicóloga Virginia Eshelman Johnson, que na década de 50 iniciaram pesquisas sobre a sexualidade humana, destacam como um dos aspetos definidores deste comportamento a autossatisfação sexual obtida não só por meio da manipulação dos genitais, mas também pela estimulação de outras partes do corpo.

A própria origem etimológica do termo “masturbação” exibe alguma da ambiguidade do fenómeno. Poderá ter origem no latim, em masturbatio, provável deformação de manus turbatio, que traduz simplesmente a ideia de agitar ou esfregar com a mão, ou ainda em manus stupratio, ou seja, sujar com a mão, ou, muito menos simples, no grego, em mastropeuo que significa prostituir.

E se o estudo da sexualidade humana ao longo dos tempos contribuiu para encarar a prática como fazendo parte do desenvolvimentos sexual de cada indivíduo, sendo, por essa razão, natural e saudável, o mesmo não se podia dizer há uns séculos atrás. De facto, a Igreja e a Medicina dos séculos XVII e XVIII foram os principais responsáveis, pela conotação pecaminosa e doentia atribuída ao ato da masturbação. Na perceção de São Tomaz de Aquino, este comportamento estava entre os pecados mais graves, só comparado ao incesto, e a ele atribuídas várias consequências graves, entre as quais a loucura e o suicídio.

E apesar de a medicina ter feito alguns avanços, como a descoberta dos espermatozoides em 1677 (só possível graças à masturbação), ainda em meados do século XVIII foi lançado o livro “Ensaio sobre as doenças causadas pela masturbação”, do famoso médico suíço Samuel Tissot. Foi apenas a partir do século XX, com Sigmund Freud e outros estudiosos, que se obteve uma melhor compreensão da masturbação, como forma necessária e indispensável para a construção da sexualidade adulta.

A prática ocorre, aliás, nas diferentes fases do desenvolvimento humano. Na infância, é entendida como manipulação que assume caráter de autoconhecimento. Nesse processo de descoberta de si, as crianças procuram repetir as vivências que lhes deram satisfação e evitar as que causam algum tipo de sofrimento, seja psíquico ou físico. Com a exploração do próprio corpo a criança descobre as regiões que lhe dão prazer ao serem tocadas. Sensações e emoções experimentadas durante essa exploração servirão de base para futuras vivências sexuais. Nessa fase, ainda não tem a mesma capacidade do adulto para compreender o que faz e por que o faz: não consegue identificar o toque nos genitais como prazer erótico e não tem intenção de se estimular sexualmente.

Na adolescência, as alterações hormonais levam ao amadurecimento dos genitais, provocando novas sensações, o que intensifica a busca de prazer por meio da estimulação do próprio corpo. A maior conquista dessa fase é a aquisição do pensamento abstrato, o que possibilita o uso de fantasias como fonte de excitação sexual. Assim, a masturbação antecipa a realidade no plano imaginário, abrindo caminho à concretização de futuras relações afetivo-sexuais e favorece o processo de amadurecimento sexual.

Casal na cama

Ainda é muito comum ouvirmos homens e mulheres afirmarem, equivocadamente, que a masturbação só é praticada por adultos que não têm vida sexual ativa, por prevalecer a crença generalizada de que o amadurecimento do indivíduo leva à primazia e à exclusividade do ato sexual. Não há, no entanto, nenhum motivo que justifique tal conceção – cada prática suscita diferentes sensações de prazer, não excludentes entre si.

O início da vida a dois é, geralmente, cheio de novidades, existindo muita energia para ser investida no relacionamento sexual. Nesta etapa da vida, a masturbação solitária pode tornar-se para alguns uma atividade rara. Contudo, é possível tirar proveito dessa prática por meio da estimulação mútua, o que pode ser um interessante instrumento de descoberta erótica para o casal, ao permitir que cada um dos parceiros conheça melhor o corpo e a sexualidade mútua. Até porque, mais não seja pelas diferenças anatómicas, o ato da masturbação, e tudo o que o envolve, apresenta diferenças nos dois géneros.

Masturbação no feminino e no masculino

Sem dúvida uma das diferenças entre os dois sexos no que toca a masturbação é a forma como o ato em si é encarado. A masturbação feminina ainda é alvo de muitos tabus e preconceitos.

Dormir melhor

Poucas mulheres falam sobre o assunto ou assumem a sua prática, isto porque, a maioria, através de uma educação repressiva aprendeu que isso “não é coisa para se fazer”. E, se as meninas descobrem a masturbação mais tarde, de maneira acidental ou pela curiosidade com o próprio corpo, os rapazes dão início à sua prática mais cedo por relatos de experiências de colegas, troca de informações de grupos aos quais pertencem (escola, ginásio), e também pelo acesso a materiais erótico-pornográficos.

Quanto à técnica, a masturbação não tem uma técnica padronizada. Pode dizer-se que cada indivíduo que se masturba usa a sua própria técnica. As formas de masturbação no universo feminino são muito mais diversas, inventivas e criativas do que no masculino. O homem tende, na maior parte das ocasiões, a dar exclusiva atenção aos genitais, seus e da outra pessoa. Já a masturbação feminina é rica em variantes relativamente, por exemplo, às zonas estimuladas direta ou indiretamente, gestualidade, com o que é feita, ambiente criado, etc.

No que respeita à fantasia associada à masturbação, os homens estimulam-se recorrendo à recordação ou à visualização de imagens eróticas, ou seja, têm uma fantasia sexual mais centrada, enquanto nas mulheres a imaginação é mais global e envolvente. Estes estereótipos, no entanto, estão em declínio sendo cada vez mais frequente as mulheres utilizarem a literatura, revistas temáticas e filmes de cariz erótico-pornográfico.

A técnica utilizada também tem vindo a sofrer algumas alterações. Enquanto os homens, em geral, continuam a utilizar a técnica manual, as mulheres, sobretudo a partir de uma certa idade, e as que têm algum poder de compra e espírito aventureiro, recorrem cada vez mais à parafernália de dispositivos mecânicos que o mercado disponibiliza para o efeito.

A frequência com que o ato é praticado também difere nos dois géneros, sendo mais elevado entre os homens, o que levanta uma questão: existirá o perigo de masturbação excessiva? Para começar, não existe uma frequência dita “normal” para a prática. Assim, desde que não seja compulsiva, não provoque sentimento de culpa, não prejudique a vida pessoal, escolar, profissional e social normais é impossível alguém masturbar-se excessivamente porque o corpo simplesmente não deseja nem, no caso dos homens, pode.

Homem tablet

Como pontos comuns aos dois sexos apontam-se os benefícios da prática, como seja a sensação de bem-estar que se experimenta. Tal como no coito, a masturbação também faz com que sejam libertadas hormonas no organismo, como a ocitocina e a dopamina, que aumentam a sensação de prazer e relaxamento, e fazem com que a pessoa se sinta melhor após o ato. Esta sensação de bem-estar contribui para um sono mais profundo e reparador. Pode até dizer-se que seja uma saída interessante quando se está com insónias. Outro dos benefícios para ambos os sexos é uma melhoria do desempenho sexual e conhecimento do próprio corpo. Ao descobrirmos sozinhos o que nos dá prazer, mais prazer teremos quando acompanhados.

Além dos fatores comuns a ambos os sexos, os homens obtêm outros benefícios da prática, como a promoção da ereção – o sexo ou a masturbação regulares trabalham os músculos da região pélvica, prevenindo a incontinência e a disfunção erétil –, o controle da ejaculação, e a prevenção de cancro da próstata.

Na mulher, o exercício provocado pelo orgasmo nos músculos do pavimento pélvico ajuda a aliviar as cólicas que surgem no período pré-menstrual, fortalecendo-os, o que evita o surgimento de incontinência urinária. O orgasmo também ajuda no alongamento dos músculos do colo do útero, libertando e eliminando muco cervical, o que faz com que possíveis bactérias patogénicas que podem causar infeções vaginais sejam eliminadas com maior frequência, prevenindo infeções.

Cama pés

A masturbação na mulher também pode ser útil para ajudar a tratar problemas sexuais como dispareunia e vaginismo, aumentar a libido e a autoestima, existindo estudos que sugerem que as que a praticam são menos suscetíveis a desenvolver doenças cardíacas e diabetes tipo 2.

Apesar de todos os benefícios identificados, esta prática sexual continua a ser um assunto polémico rodeado de tabus e uma barreira difícil de transpor e normalizar, que é de todo o interesse esclarecer.

Os mitos e as realidades

Ao longo da história da humanidade muitos mitos surgiram para criar um processo de repressão moral e religiosa da masturbação. Essas histórias foram passando de geração em geração para assustar e impedir a sua prática, razão pela qual é importante conhecê-las, e desmistificar o tema.

Para uma melhor compreensão, dividiram-se os mitos desta prática em consequências físicas, psicológicas e sexuais. Das consequências físicas fazem parte alguns dos mitos mais surpreendentes e, saliente-se, sem qualquer evidência médica, como sejam: a masturbação faz crescer pelos nas mãos; faz cair o cabelo; faz surgir cálculos nos mamilos e crescer o peito nos rapazes (ginecomestia); causa acne, borbulhas ou espinhas na face; faz com que um braço fique mais comprido que o outro; provoca doenças, por exemplo pulmonares, nomeadamente a tuberculose; provoca cegueira ou no mínimo miopia; causa gota, artrite e surgimento de sangue na urina; causa infeções urinárias; provoca ganho/perda de peso; deforma os órgãos genitais femininos e faz com que a rapariga perca a virgindade – na verdade a introdução do dedo ou objetos na vagina pode provocar a rutura do hímen, mas virgindade não é sinónimo de hímen intacto; aumenta o tamanho do pénis e torna-o mais fino (o aumento do pénis seria a concretização do sonho da maioria dos adolescentes, mas não é verdade); provoca cancro da próstata na terceira idade – o que acontece é precisamente o oposto, sabe-se que homens com mais de 50 anos que ejaculam com frequência estão mais protegidos deste tipo de cancro.

Que a masturbação pode provocar loucura; revela ou causa problemas emocionais; pode viciar; provoca perda de memória e outros problemas intelectuais e cerebrais; e provoca isolamento e sentimentos de culpa, são algumas das consequências psicológicas atribuídas à pratica do ato – tudo suposições sem qualquer evidência médica. Quanto aos sentimentos de culpa, se um adolescente for educado no sentido de interiorizar que a masturbação é um ato vergonhoso ou que é pecado, é natural que sinta culpa se o fizer, mas a culpa decorre do tipo de educação e não do ato em si.

Orgasmo masculino

As consequências sexuais atribuídas à masturbação requerem uma explicação mais detalhada pois envolvem problemas mais complexos. Se por um lado se diz que dificulta a gravidez e causa esterilidade, por outro diz-se que pode engravidar. Na verdade, a masturbação a dois pode engravidar se não existirem os devidos cuidados por exemplo com as mãos, que podem fazer chegar espermatozoides à vagina. Outro dos mitos falsos que circula, é que causa impotência, o que não deixa de ser preocupante caso o homem só consiga ter uma ereção e chegar ao orgasmo dessa forma. Que prejudica o desejo sexual também está entre os mitos atribuídos à prática mas, na verdade, a masturbação desperta a libido pois está, geralmente, associada à fantasia e tem um grande potencial erótico.

Como se todos os problemas mencionados não fossem suficientes para aterrorizar o comum dos mortais que praticam a masturbação, consta ainda que só gente perversa se masturba; que as pessoas heterossexuais com um parceiro permanente não o fazem; que apenas virgens sentem prazer no ato; ou que é um comportamento que denuncia tendências homossexuais.

Sendo ou não verdadeira alguma destas suposições, enquanto se continuar a negar a existência da possibilidade de masturbação, todos somos corresponsáveis pela manutenção de todos os mitos e tabus que rodeiam o tema.

Surpreendentemente, nos últimos anos a investigação tem apresentado a masturbação como um indicador de saúde sexual, mais não seja porque permite uma aprendizagem sobre o corpo (genital e não só) e sobre a resposta sexual. Para a ciência é uma prática sexual normal, saudável e desejável, que ao longo da vida pode fazer – sem qualquer sentimento de culpa –, parte do repertório sexual de qualquer homem ou mulher, independentemente de haver ou não um contexto relacional.

Autor:
Tupam Editores

Última revisão:
28 de Novembro de 2024

Mais Sobre:
SEXUALIDADE HOMEM MULHER

Referências Externas:

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