Comichão, vermelhidão, perda de pelo excessiva e irritação são alguns dos sintomas da doença alérgica mais conhecida dos médicos veterinários dermatologistas. Campeã de casos nas consultas, a dermatite atópica pode ocorrer em cães e gatos de todas as raças e de qualquer porte. E o pior é que a incidência da doença tem vindo a aumentar.
O motivo pode muito bem ser a mudança no estilo de vida dos animais. Antigamente, cães e gatos permaneciam a maior parte do tempo em ambiente externo, em contacto com a natureza, expostos à biodiversidade, conviviam e sociabilizavam com múltiplos animais, da mesma espécie e de outras espécies, e estavam em constante atividade.
As mudanças no estilo de vida inerentes à urbanização fizeram com que os animais domésticos passassem a conviver com os humanos em ambientes internos, a dividir os espaços comuns e a permanecer a maior parte do tempo na sala de estar e nos quartos, em moradias com excesso de mobília, tapetes, cortinas, carpete e pouca ventilação.
Estes animais passaram a ser “esterilizados”, desenvolveram uma vida sedentária, e foram submetidos a uma ampla e variada dieta e hábitos alimentares inerentes aos humanos.
Passaram a ser vacinados e vermifugados regularmente, a tomar banhos frequentes, estar expostos a cosméticos, a usar roupas de material sintético e lã, deitam-se sobre as camas e travesseiros dos seus tutores e são criados isolados do convívio com outros animais.
A junção destas mudanças do estilo de vida e o aumento da criação de raças específicas levou ao desenvolvimento e aumento progressivo da incidência de doenças alérgicas em animais de companhia em todo o mundo, especialmente dermatite atópica (DA) em cães, e rinite, rinosinusite e asma alérgica nos gatos.
O desenvolvimento destas doenças alérgicas veio acompanhada de problemas psiquiátricos e compulsões associadas, principalmente, a doenças ansiosas, distúrbios de sociabilização e doenças endócrinas, como a obesidade.
As crises das doenças de pele nos animais são muito mais complexas do que se possa pensar, e não devem ser menosprezadas, razão pela qual convém saber mais sobre a atopia.
A dermatite atópica canina e felina
A DA é a segunda forma de alergia mais comum em cães. Trata-se de uma síndrome complexa e multifatorial na qual tem um papel fundamental a genética do indivíduo e a sua relação com os agentes alergénicos implicados.
A doença, que é hereditária, ocorre quando cães hipersensíveis contactam ou inalam alérgenos comuns, como ácaros do pó, pólens, agentes poluentes e leveduras, originando a reação alérgica cutânea.
Embora existam algumas raças de cães que são geneticamente predispostos a desenvolver a condição – como o Pastor Alemão, Boxer, Labrador Retrivier, Golden Retrivier, Cairn Terrier, Fox Terrier, Setter Irlandês, Caniches, Schnauzer Miniatura, Dálmata, Cocker Spaniel, Pug, Shar Pei, Lhassa Apso e West Highland Terrier –, qualquer cão pode sofrer de DA.
A sintomatologia costuma aparecer entre os 6 meses e os 3 anos de vida dos animais. As lesões iniciais começam como pequenas pápulas ou áreas de eritema (zonas avermelhadas), sendo o principal sinal o prurido (comichão).
Os cães mordiscam-se, esfregam-se em superfícies, lambem, roem e coçam a sua pele nas áreas afetadas. Estas ações acabam por piorar a inflamação cutânea e causam lesões adicionais, tais como perda de pelo, pele seca e escamosa, hiperpigmentação (pele mais escura) e infeções secundárias.
A DA tem um padrão típico de distribuição das lesões. Estas, e a comichão, ocorrem essencialmente na face, patas, pregas de pele, axilas, virilhas e pontos de flexão e fricção (ex: cotovelos).
Com o passar do tempo a pele irá ficar mais fina e produzir altos níveis de secreções sebáceas e sudoríperas, tornando a pele muito odorífera. A maioria dos animais afetados desenvolve infeções bacterianas e fúngicas secundárias.
Outros sinais clínicos que também poderão estar associados são crises de espirros, conjuntivite, rinite, otite externa e alteração da cor da pelagem.
Porque várias doenças de pele provocam prurido, o médico veterinário realiza os testes de diagnóstico e ensaios terapêuticos necessários para excluir outras doenças, de forma a obter um diagnóstico definitivo de DA. Uma vez confirmada a doença, o veterinário ainda pode realizar testes de alergias para tentar descobrir uma causa exata.
Existem dois tipos básicos de testes de alergias: o exame de sangue, que pode confirmar a presença de anticorpos contra os alérgenos responsáveis pela DA no sangue do cão; e os testes intradérmicos, em que são injetados na pele pequenas quantidades de diversos alérgenos, e através da medição da reação local a cada um deles, é possível determinar quais são os responsáveis.
A DA é uma doença crónica, muitas vezes complicada por infeções concorrentes. Infelizmente não existe cura definitiva, sendo o objetivo do tratamento tentar manter a sintomatologia controlada com o mínimo prejuízo para o estado de saúde geral do animal.
A DA felina é uma área da dermatologia veterinária que permanece relativamente menos elucidada do que a canina.
Embora faltem estudos sobre a sua incidência e prevalência, é reconhecida como uma condição frequente e alguns investigadores declaram que é a causa mais comum de alergia em gatos (73 por cento de todos os gatos alérgicos).
Não parece existir uma predisposição racial na DA felina, embora existam estudos a sugerir os Abissínios como uma raça predisposta. Na maioria dos gatos os sinais clínicos desenvolvem-se numa idade jovem, entre os 6 meses e os três anos.
Os principais alérgenos ambientais envolvidos na DA incluem os pólens, pó ou poeira doméstica. Os mais comuns são os alérgenos não sazonais, entre estes as reações ao ácaro de poeira doméstica (principalmente Dermatophagoides farinae) são as mais prevalentes em gatos atópicos.
Tal como na DC canina, na felina o prurido também é o sinal clínico mais importante.
Os gatos com DA apresentam um ou mais padrões lesionais cutâneos, como: dermatite miliar, dermatite de cabeça e pescoço, alopecia auto-induzida ou dermatoses eosinofílicas (úlcera indolente, placa eosinofílica, granuloma eosinofílico).
Considerando que existe uma grande variedade de doenças com sinais clínicos semelhantes, é por vezes difícil realizar um diagnóstico correto de DA nos gatos.
É essencial a realização de um exame físico completo e obter a historia clínica detalhada do felino antes de proceder a testes diagnósticos ou ensaios terapêuticos, de forma a excluir diagnósticos diferenciais e confirmar a DA felina.
Os testes alergológicos estão reservados para os animais em que se suspeite fortemente de alergia ambiental.
O objetivo é identificar os alérgenos agressores para a sua inclusão em imunoterapia específica.
Os testes intradérmicos são considerados o método “padrão-ouro” para demonstrar hipersensibilidade alérgeno-específica no cão, contudo, este teste é, muitas vezes, frustrante e de difícil interpretação no gato.
Por se tratar de uma doença incurável, com manifestações e complicações variáveis, é muito importante que o médico veterinário explique aos tutores todas as formas possíveis de tratamento, detalhando índices de sucesso, efeitos colaterais e custos.
O tratamento e as novas soluções para a DA
A DA é uma doença crónica muitas vezes complicada por infeções concorrentes, e o seu maneio envolve várias abordagens terapêuticas.
Teoricamente, evitar o contacto com os alérgenos seria a melhor solução, mas na maioria dos casos isto não é possível. De qualquer forma, quanto mais alérgenos se consigam controlar maior a probabilidade de controlar a atopia, e menor a exacerbação da intensidade e frequência dos sintomas.
Os corticosteroides, também conhecidos como glicocorticoides, são extremamente eficazes no alívio do prurido e da inflamação, contudo, o seu uso a longo prazo tem muitos efeitos secundários no animal (aumento de sede, quantidade de urina emitida, peso e, entre outros, predisposição para o desenvolvimento de doenças endócrinas graves como a Síndrome de Cushing e a diabetes).
A ciclosporina é uma nova terapia oral especificamente desenvolvida para o tratamento da DA. Está provada a sua eficácia no alívio dos sintomas, não tendo os efeitos secundários da terapia a longo prazo do uso dos corticosteroides. Na espécie felina é mesmo o fármaco mais promissor.
Os anti-histamínicos também podem ajudar a controlar o prurido, especialmente em conjunto com outros tratamentos, contudo, como os animais respondem de formas diferentes aos diversos anti-histamínicos, vários tipos terão de ser experimentados até se encontrar o mais eficaz.
No caso dos felinos os anti-histamínicos têm-se revelado eficazes apenas quando associados a ácidos gordos essenciais – quando usados isoladamente, os resultados não são satisfatórios. Estes ácidos gordos são agentes com algumas propriedades anti-inflamatórias. Usados como suplementos nutritivos, são úteis como auxiliares do tratamento.
Os tratamentos locais na DA consistem em champôs, loções e soluções tópicas antipruriginosas e antisséticas, que oferecem alívio rápido dos sintomas (embora de pouca duração).
O futuro do tratamento da doença, porém, passa pela imunoterapia, de forma a dessensibilizar o animal face aos alérgenos aos quais reage. Para o efeito são administradas uma série de injeções durante um período de tempo. Quando efetiva, esta terapia é uma opção válida, contudo, nem todos os animais respondem positivamente.
Numa tentativa de compreender melhor a DA e de arranjar novas soluções de tratamento, são realizados novos estudos continuamente. Nos últimos anos tem sido estudada a utilização de novos fármacos, mais específicos para o controlo da doença e com menos efeitos secundários. O destaque aqui vai para as substâncias oclacitinib e lokivetmab.
O oclacitinib pode ser considerado como tratamento de primeira linha para o prurido associado a DA em cães, independentemente da causa subjacente.
Já o lokivetmab vem alterar o paradigma do tratamento da DA canina, e marca a entrada numa nova era terapêutica, em que se deixam de lado os medicamentos convencionais e se passa a falar de medicamentos biológicos, isto é, que mimetizam uma ação natural e intrínseca ao organismo.
O maleato de oclacitinib é um imunomodulador (um medicamento que altera a atividade do sistema imunitário) que atua bloqueando a ação das enzimas Janus Quinase (JAS). Estas enzimas desempenham um papel importante nos processos inflamatórios e pruríticos, incluindo os envolvidos na dermatite alérgica e DA em cães.
Este já é utilizado com sucesso em cães, e poderia ser uma alternativa ao uso da ciclosporina com menos efeitos colaterais em gatos, porém, nesta espécie faltam estudos que indiquem a sua real eficácia, razão pela qual ainda não é utilizado.
O lokivetmab é um anticorpo monoclonal que foi concebido para reconhecer e ligar-se à interleucina-31, uma proteína que desempenha um papel fundamental no desencadear da DA em cães. Ao bloquear a interleucina-31, o lokivetmab reduz a pele pruriginosa e a inflamação.
O fármaco é injetado mensalmente e apresenta várias vantagens pois não é tóxico ao organismo do animal, uma vez que se utilizam anticorpos praticamente iguais aos produzidos por este.
Além de todas as possibilidades apresentadas, o maneio da DA requer, por vezes, o uso de outros produtos como antibióticos e antifúngicos para tratar infeções concorrentes.
É igualmente essencial fazer um tratamento vigoroso contra as pulgas e outros parasitas externos a fim de prevenir as alergias e outros danos, pois em animais atópicos tudo o que agrida a pele contribui para agravar a condição.
Acima de tudo, é fundamental que o dono de um animal alérgico mantenha uma relação de proximidade e confiança com o seu médico veterinário, já que as recidivas são frequentes e os tratamentos podem variar ao longo da vida do animal.
Não há uma receita única/universal que resulte bem com todos os animais atópicos, cada caso é um caso. Já o objetivo final é comum… restaurar a saúde e bem-estar do seu amigo de quatro patas.
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