COLUMBOFILIA, CITIUS, ALTIUS, FORTIUS
AVES
Tupam Editores
Os pombos nem sempre são bem vistos pela sociedade. Quando se fala de pombos, as imagens invocadas na mente da maioria das pessoas reportam às aves que habitam nas cidades e que circulam pelo ar, pelos passeios, pelos monumentos, enfim, por todo o lado.
Alguns centros urbanos já sofrem de sobrepopulação de pombos e encontram-se agora a tomar medidas para tentar controlar o problema pois há quem afirme que os animais acarretam riscos em termos de saúde pública, designadamente ao nível de problemas respiratórios, alérgicos, dérmicos, oculares e gastrointestinais.
A realidade do pombo "citadino" acaba, muitas vezes, por condicionar o conceito que se tem de pombo-correio.
As diferenças, contudo, são significativas. Estes são sistematicamente desparasitados, vacinados e controlados no que respeita a qualquer doença que possa comprometer o seu desempenho desportivo e, ao contrário do que a maioria das pessoas pensa, estes pombos não representam qualquer perigo em termos de saúde pública.
Pode mesmo afirmar-se que o pombo-correio é a ave doméstica mais saudável do mundo, e um dos animais mais seguros no que respeita à saúde humana. As razões são pelo menos duas, vive fora de casa das pessoas e o número de zoonoses transmissíveis é bastante menor que, por exemplo, em cães, gatos ou porcos.
O pombo foi uma das primeiras aves a ser domesticada, provavelmente por volta do ano 3000 a.C. e a ser usado como mensageiro, cerca do ano 1800 a.C. Várias são as histórias sobre o pombo-correio, no que refere ao transporte de mensagens ou códigos, até aos confins do mundo. Existem relatos emocionantes envolvendo pombos-correio, que marcaram de lembranças a vida humana; momentos dramáticos de conflito, horas de paz e alegria, ansiedade, ocasiões de festa ou desgosto, momentos de diversão.
Os bilhetes escritos, dobrados e atados a um colorido fio de seda, chegavam até aos seus destinatários, através da capacidade ímpar do pombo-correio, que cortando o vento e desafiando tempestades, desde há séculos, faziam chegar utilíssimas informações aos quatro cantos do mundo.
Com o aparecimento das novas tecnologias o pombo ganhou uma nova dimensão: a nível desportivo, com a realização de provas durante grande parte do ano, e a nível social, com a instalação de pombais em jardins-de-infância, escolas e lares de 3ª idade.
Fruto de cruzamentos de algumas raças de origem belga e inglesa, efetuadas na segunda metade do século XIX, o pombo-correio tem sido continuamente selecionado com o objetivo de apurar duas características principais: a sua capacidade de orientação e o fenótipo atlético.
Fundamentalmente, o pombo-correio é distinguido pelo seu voo especial, vivacidade, plumagem macia e sedosa, de elevado coeficiente aerodinâmico e capaz de minimizar a resistência ao atrito durante o voo. Outras características relevantes são o seu instinto gregário e sentido de orientação, visão apurada e sentido labiríntico pronunciado, permitindo-lhes uma execução perfeita dos movimentos de voo, advertindo-os das mais pequenas variações de cota ou de direção.
A columbofilia é a arte de criar pombos-correio, com fins desportivos. O seu fundamento baseia-se na capacidade, inata, que estas aves possuem em regressar ao seu pombal de origem, quando postos em liberdade, a grandes distâncias da sua base de largada.
Em função dessa capacidade de orientação, com o treino a que se submete, o seu amor ao ninho, ao cônjuge, ao seu pombal e ao próprio treinador, assim percorre estas distâncias em mais ou menos tempo.
E, se atualmente o pombo-correio tem uma verdadeira dimensão na área desportiva, no passado foi uma importante ferramenta de comunicação em cenários de guerra. As aves foram utilizadas ao longo dos tempos em situações difíceis, como meio de transmissão de informação, designadamente nas duas Grandes Guerras Mundiais, onde atuaram como mensageiros entre os soldados nos campos de batalha e as respetivas bases.
Na I Guerra Mundial, mais de 30 mil pombos-correio foram utilizados nas frentes de combate, sobressaindo o episódio do Forte de Vaux, e a heróica batalha de Vérdun. Na II Guerra Mundial, assistiu-se ao êxito das mensagens aladas, sempre que as comunicações via-rádio eram intercetadas ou perturbadas pelo inimigo. Existem pombos-correio condecorados por "mérito de guerra".
A columbofilia como desporto teve início na Bélgica a 15 de julho de 1820. Em Portugal o início da columbofilia em clubes e associações remonta a 1900. Por volta de 1932 é criada a então Sociedade Columbófila do Algarve, e em 1948 o Estado português concedeu ao pombo-correio o estatuto de utilidade pública (Decreto-Lei n.º 36767 de 26/02/1948).
Atualmente a estrutura columbófila está organizada como qualquer outro desporto. Tem uma Federação nacional (Federação Portuguesa de Columbofilia) que rege as associações distritais, e cada associação distrital tem os seus clubes.
Hoje estas aves são protagonistas de um desporto com o maior número de praticantes em Portugal, depois do futebol. A columbofilia nacional conta com cerca de 20 mil associados em 766 clubes estando registados na Federação cerca de quatro milhões e 500 mil pombos.
Na columbofilia tradicional, excluindo o fenómeno mais recente dos one-loft-races ou derbies, a época desportiva decorre, aproximadamente, desde o início de março até final de junho. Em cada fim-de-semana há concursos, que podem ser de velocidade (percursos de 150 a 300 quilómetros), de meio-fundo (301 até 500 quilómetros), fundo (de 501 até 800 quilómetros) ou de grande fundo (mais de 800 quilómetros).
Se está entre os que desconhecem esta modalidade, e pensa tornar-se columbófilo, aqui ficam os primeiros passos a dar, alguns conselhos e chamadas de atenção, que devem ser aprofundados através de leituras técnicas e trocas de impressão com columbófilos experientes, ou através da Federação.
O primeiro passo é dirigir-se à coletividade mais próxima de residência e fazer a inscrição. Depois disso deve inscrever-se na federação e pagar a respetiva quota, passando a ser automaticamente abrangido pelo seguro desportivo.
Só depois de estar devidamente inscrito poderá ter pombos-correio ou comprar anilhas oficiais, uma vez que a lei de proteção ao pombo-correio assim o determina.
Há que ter consciência de que a columbofilia é, acima de tudo, um ato de amor. O pombo-correio passa a ser um companheiro, um amigo, que necessita de ser entendido, cuidado e acarinhado diariamente.
A fase seguinte é a construção do pombal.
Independentemente da sua geografia, tamanho, forma ou estrutura, o pombal deve oferecer aos pombos luz solar durante o dia, e um lugar seguro para descansar à noite.
Os pombais variam de uma região para outra. Podem ser totalmente abertos, semiabertos ou fechados e construídos em madeira ou alvenaria.
O volume também pode variar, desde uma simples gaiola de 1 metro cúbico a um grande pombal com várias divisões, mas é de especial importância que responda a três exigências: estar bem limpo, exposto ao sol e seco, que as suas instalações sejam práticas, simples, livres de parasitas e que esteja protegido de animais daninhos.
A orientação do pombal deve evitar as correntes de ar e a direção em que os ventos possam fazer penetrar a chuva. Uma boa orientação é, em geral, a de sudoeste ou a de sudeste. A temperatura deve ser agradável e o pombal deve permitir aos pombos gozar os primeiros raios de sol. Deverá ter boa luz natural, mas não excessiva, pois as fêmeas procuram com frequência as zonas escuras para construir os seus ninhos.
As paredes bem como os tetos devem ser lisos, e os pavimentos podem ser construídos em madeira, placa de cimento ou rede metálica. Utilizam-se, também, com grande frequência, grelhas metálicas ou de madeira colocadas a pelo menos 30 cm acima do pavimento, a fim de evitar o contacto direto das patas dos pombos com os excrementos, o que tem importância profilática contra algumas afeções, nomeadamente, parasitoses intestinais.
A janela ideal de entrada, saída e reconhecimento deve ter cerca de 8 a 10 cm de largura de maneira a que os pombos possam passar no sentido de cima para baixo, possam saltar livremente para a mísula exterior e daí iniciar o voo.
Os casulos podem ser fabricados em alvenaria ou madeira, formando 3 ou 4 pisos, e são colocados habitualmente na face contrária à entrada do pombal. Os ninhos são normalmente caçarolas de barro cozido, que devem ser revestidos de areia para impedir a rutura dos ovos.
Os comedouros têm de ser simples e fáceis de limpar e nos bebedouros é essencial que a água esteja sempre limpa e seja mudada diariamente. Estes podem ser de plástico, barro ou metal e devem ser colocados a 50 cm do solo para evitar a entrada de poeiras e penas.
Os poleiros colocam-se paralelamente à parede em número suficiente para que todos os pombos se possam instalar, a uma altura máxima de 1,80 m do chão e de forma a que não seja possível os pombos dos poleiros mais elevados sujarem os que estão mais abaixo.
As dimensões do pombal dependem, principalmente, do número de aves a albergar, do tipo de concursos em que participarão e do tipo de técnica que o futuro columbófilo irá adotar. A quantidade ótima deverá rondar os 3 a 5 por metro cúbico.
A gestão de um pombal é particularmente importante na proteção e posterior recuperação de uma eventual infeção. O conhecimento de práticas de maneio corretas, onde se inclui a habitação, a densidade populacional, design dos poleiros e ninhos, qualidade e métodos de alimentação e as estratégias de competição, são importantes para o controlo de doenças.
O futuro columbófilo deve ter em mente que, segundo a legislação em vigor, a edificação de pombais para pombos-correio está sujeita a prévio licenciamento camarário. Para evitar futuras situações desagradáveis, é aconselhável que, após a elaboração do projeto de construção (plantas), estas sejam enviadas à Federação, acompanhadas da memória descritiva e mapa de implantação do pombal, para que, de acordo com o estipulado na lei de proteção da espécie, sejam sujeitas a aprovação e registo federativo prévios.
Ultrapassadas as primeiras etapas, e para se tornar um bom columbófilo, deve conhecer as aves, suas características, hábitos alimentares, como se processa a sua aprendizagem e possíveis perigos com que se deparam os pombos-correio nas suas viagens.
Como já referido o atual pombo-correio é resultado de cruzamentos de raças, levados a cabo no passado, e continuamente aperfeiçoados tendo por objetivo apurar o sentido de orientação e um morfotipo atlético. Entre outras, o pombo-correio possui como caraterísticas a endurance, a vivacidade, rapidez de voo, penas abundantes e brilhantes, rabo sempre pregueado, pescoço fortemente implantado, muito erguido e uma grande resistência à fadiga.
As suas penas cumprem vários funções, formam uma capa termo-isoladora, organizam as superfícies impulsoras da asa e dão ao corpo a forma aerodinâmica que o caracteriza.
Estas renovam-se anualmente, sendo esta atividade fisiológica designada como muda da pena que, sendo mais ou menos contínua e lenta durante o ano, tem a chamada "grande muda" entre os meses de julho a outubro. Este evento deverá ser perfeitamente conhecido, porque representa um momento crítico na vida desportiva do pombo-correio. Assim, qualquer falha ou patologia nesta fase irá comprometer e reduzir, visivelmente, o desempenho da ave durante as provas mais exigentes.
Com um peso médio compreendido entre 425 e 525 gramas para os machos e 480 gramas para as fêmeas, estes animais são capazes de percorrer, num só dia, distâncias de 700 a 1000 Km, a velocidades médias superiores a 90 km por hora.
Tal como para qualquer atleta, a aprendizagem e o treino cuidado são os segredos para que estes animais consigam percorrer grandes distâncias em voo ininterrupto. Esta aprendizagem começa logo a partir do seu nascimento e tem como principais objetivos a adução ao pombal e proporcionar-lhe o vigor e preparação necessária para que, quando solto, regresse ao pombal de origem em segurança e com a maior rapidez.
A educação destes atletas faz-se de forma gradual. Quando os borrachos têm cerca de 25 dias já podem autoalimentar-se. É a altura de os separar dos pais e alojá-los num sector especial só para eles. Esta separação é conhecida como o "desmame".
Quando se formar um grupo de borrachos, em que os mais jovens já tenham cumprido três meses de idade, e que já voem livremente pelo exterior do pombal há mais de um mês, pode dar-se início aos voos preliminares de reconhecimento dos arredores. O primeiro voo deve fazer-se num dia claro e sereno, pouco antes da primeira distribuição da comida aos pombos, desde um ponto livre, situado, aproximadamente, a um quilómetro do pombal. Em voos sucessivos, vai-se aumentando gradualmente essa distância até atingir 8 a 10 quilómetros.
Terminada esta fase de voos, tem-se já a certeza de que os borrachos conhecem perfeitamente o ambiente circundante. Logo que possível devem ser soltos um a um, para que não regressem em bando, mas sim individualmente. Depois, progressivamente, vai-se aumentando a distância para 40, 75, 100 e 150 quilómetros. Estes voos são realizados com todos os borrachos em simultâneo e, com a sua realização, dá-se por concluída a aprendizagem durante o primeiro ano.
Existem hoje algumas associações que promovem concursos de borrachos. No segundo ano, os "pombos de ano" podem voar até 500 quilómetros, ou mais, começando com treinos progressivos, para que o pombo vá ganhando forma, antes de alcançar a distância que se deseja.
Um atleta não deve os seus sucessos exclusivamente à aprendizagem e treino, mas também a um cuidadoso e equilibrado plano alimentar.
Na columbofilia, os métodos de alimentação são muito variáveis. A alimentação base deve ser uma mistura de grãos de leguminosas (favas, ervilhas) e cereais (trigo, cevada, milho).
As proporções podem variar de acordo com as preferências e necessidades do columbófilo, tendo em atenção os diferentes períodos fisiológicos e desportivos.
A prática corrente, durante o período desportivo, é alimentar os pombos com cereais no início da semana, aumentando o valor proteico à medida que se aproxima o dia do concurso. Para fazer e escolha mais acertada quanto ao tipo de ração, pode obter-se aconselhamento nas boas casas da especialidade.
Os pombos-correio devem, também, ter sempre à disposição uma mistura de "grit" (pequenas pedrinhas que atuam à maneira de dentes, triturando o alimento a nível da moela). Regularmente, deve-se, também, administrar verduras (alface, couve, etc).
Apesar de uma alimentação cuidada e dos treinos meticulosos os pombos-correio estão expostos a vários perigos quando em competição, como sejam as condições meteorológicas e orográficas adversas, as aves de rapina, contra as quais não existe nenhum meio eficaz, e os caçadores que, por ignorância ou intencionalidade, confundem estes animais com outros tipos de pombos não protegidos por lei.
A columbofilia surgiu como desporto familiar praticado no pombal, na maioria das vezes, no próprio domicílio do columbófilo. Na atualidade, além destes ainda se manterem, surgiram as aldeias columbófilas, que englobam um conjunto de pombais de diversos columbófilos integrados num mesmo espaço, tendo surgido o conceito de columbódromos, nos quais se reúnem no mesmo espaço, pombos de diversos columbófilos locais, nacionais e internacionais. Contudo, independentemente do género praticado, a base do desporto é a mesma.
Assim, este desporto propicia um universo de competições, que consiste basicamente em soltar os pombos em locais distantes do seu pombal, com o objetivo de que regressem o mais rapidamente possível.
Em Portugal, as competições ou período de campanha desportiva, são realizadas anualmente de fevereiro a junho. Neste período, semanalmente, os pombos de cada columbófilo são levados a uma coletividade onde são inscritos para participarem no concurso.
Conhecidas as bases desta modalidade que desenvolve os sentimentos biológicos da Natureza, e que sensibiliza para a proteção do meio ambiente, pode ter início uma relação com os animais que chega a ser tão forte como a que se estabelece entre um treinador de futebol e os seus jogadores.
Estes laços vão ser necessários para que quando enviar os seus pombos para as competições, estes regressem o mais rapidamente possível.
Enquanto espera pelos seus pombos, o columbófilo cria um enorme estado de ansiedade, de nervosismo interior, de emoção e de expetativa, que tem a sua maior expressão no momento da chegada, apreciando e valorizando os seus seres alados depois do esforço por estes realizado.
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