Ambiente afeta mais o processamento cognitivo do que a genética
Os estudos realizados em gémeos provaram ser inestimáveis para desvendar os efeitos da genética e do meio ambiente na biologia humana. Num estudo recentemente publicado na revista Cell Reports, uma equipa de investigadores estudou pares de gémeos para descobrir como a interação da genética e do ambiente afeta o processamento cognitivo – a forma como as pessoas pensam.
MEDICINA E MEDICAMENTOS
NEUROCIÊNCIAS
As neurociências nasceram da vontade e da necessidade de o Homem saber mais sobre um dos órgãos mais importantes do organismo, resultando da interacção entre várias áreas do saber. LER MAIS
Segundo Xiaohong Wan, da Universidade Normal de Pequim, na China, os estudos realizados anteriormente sugerem que a inteligência geral – muitas vezes referida como quociente de inteligência ou QI – é herdado numa percentagem que varia de 50% a 80%. Mas o novo estudo pode ser o primeiro a demonstrar que um tipo diferente de capacidade cognitiva, conhecida como metacognição e mentalização, pode ser muito mais influenciada pelo ambiente.
Funções cognitivas como percepção, atenção, memória, linguagem e planeamento são consideradas a base da inteligência geral. Estas funções regulam a forma como as pessoas organizam e processam novas informações. Por outro lado, a metacognição analisa quão bem as pessoas compreendem e controlam os seus processos cognitivos.
A metacognição é importante para o desenvolvimento de estratégias de aprendizagem e acredita-se que possa antever o sucesso escolar e social de um indivíduo. Mentalizar descreve o processo de reconhecimento e compreensão de estados mentais como emoções e atitudes, tanto em nós mesmos quanto noutras pessoas.
Participaram na investigação 57 pares de gémeos adultos monozigóticos (idênticos) e 48 pares de gémeos dizigóticos (fraternos) do Beijing Twin Study (BeTwiSt) – um estudo contínuo e de longo prazo, estabelecido em 2006, que inclui dados extensos, como imagens cerebrais e pesquisas psicológicas, além de informações genéticas, sobre pares de gémeos.
Durante o estudo os gémeos tinham de realizar tarefas relacionadas com a metacognição. Essas tarefas consistiam em observar um aglomerado de pontos em movimento num écran e fazer um julgamento perceptivo sobre a direção dos pontos. Foi pedido ainda aos participantes que avaliassem a confiança nas suas decisões. Para medir a mentalização, os participantes tinham de avaliar a confiança do parceiro nas suas capacidades de tomada de decisão.
Os resultados permitiram descobrir que pares de gémeos que tinham pais com níveis de escolaridade mais elevados e rendimentos familiares mais elevados apresentavam resultados semelhantes entre si, independentemente de serem idênticos ou fraternos. Isto sugere que o ambiente familiar tinha maior probabilidade de influenciar as habilidades metacognitivas do que a genética.
Para o autor sénior do estudo, as descobertas foram além das expectativas. Décadas de extensa investigação utilizando o paradigma clássico dos gémeos demonstraram consistentemente que se herdavam quase todas as habilidades cognitivas investigadas até agora. Este estudo veio enfatizar que esses fatores ambientais familiares partilhados, como a educação parental e a transmissão de valores culturais, provavelmente desempenham um papel significativo na formação das representações do estado mental na metacognição e na mentalização.
Os autores planeiam continuar a sua investigação nesta área, e incluir a utilização de estudos populacionais para investigar mais aprofundadamente que tipo de fatores específicos de educação parental e valores socioculturais afetam as capacidades metacognitivas e de mentalização dos indivíduos.