Com as alterações que se verificaram nas condições do mercado de trabalho nas últimas décadas, que conduziram à dignificação da mulher e a sua inserção no mercado de trabalho, antes reservado quase exclusivamente ao homem, começaram a surgir por todo o mundo, estruturas sociais externas de apoio à maternidade e à infância, com vista a cuidar e educar as crianças cujos pais e muitas vezes os avós se mantinham em atividade ou não podiam contar com o apoio de familiares.
A esses estabelecimentos educativos, privados ou cofinanciados pelo Estado, designados por creches ou infantários, está acometida a responsabilidade de ministrar apoio pedagógico e cuidados assistenciais às crianças com idades até aos três anos. Dependendo dos sistemas educativos de cada país, os infantários podem estar integrados na educação pré-escolar ou na educação infantil, podendo funcionar como estabelecimentos autónomos, integrados em outros estabelecimentos educativos mais inclusivos ou funcionar junto de empresas ou serviços privados para usufruto dos seus trabalhadores.
Em Portugal, uma creche é constituída por um espaço amplo destinado ao apoio pedagógico e cuidados das crianças com idades compreendidas entre os três meses e os três anos. Até aos três meses de idade os bebés são mantidos em berçários, transitando sucessivamente para as salas seguintes até atingirem a valência de jardim de infância, aos três anos, sendo que tanto a creche como o jardim de infância podem coexistir em infantários, colégios ou externatos. A Segurança Social é a entidade que regula e fiscaliza as atividades relacionadas com as crianças dos três meses aos três anos de idade.
No percurso evolutivo das creches em Portugal desde o seu início em finais do século XIX, verificou-se uma alternância entre uma perspetiva de apoio às famílias, marcadamente de assistência social, destinada a receber e prestar apoio a crianças e uma outra que visava a integração de um serviço educativo para as crianças mais pequenas.
Desde que surgiu a oferta deste tipo de instituições como locais de substituição dos cuidados maternos, nas quais ainda não era visível a importância do desenvolvimento de um trabalho pedagógico com a criança, até aos nossos dias, o número de crianças que recebem diariamente cuidados fora do lar de forma coletiva vem aumentando significativamente em todo o mundo.
Segundo alguns estudiosos, esta realidade vem provocar um impacto direto no comportamento das doenças infeciosas na comunidade, dado o aumento de risco para a aquisição de doenças transmissíveis a que estão expostas as pessoas envolvidas nos cuidados infantis, que pode aumentar até duas a três vezes, sendo por isso reconhecido como um problema de saúde pública.
Está descrito haver uma associação entre os cuidados prestados à criança fora do seu domicílio com o aumento do risco para aquisição de doenças infeciosas, devendo por isso ser estabelecidas medidas efetivas de controle para a prevenção da transmissão de doenças nas creches e infantários pré-escolares, ou em ambientes onde as crianças recebam cuidados em grupo.
Medidas de prevenção simples são efetivas para diminuir a transmissão de doenças, entre as quais se recomenda: lavagem adequada das mãos após exposição ao contacto; criação e seguimento de rotinas padrão de precaução; uso de rotinas para troca e descarte de fraldas em locais apropriados; limpeza e desinfeção de áreas contaminadas; uso de lenços descartáveis; áreas exclusivas para manipulação de alimentos; treino de colaboradores e orientações dos pais; notificação imediata das doenças infeciosas.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), estima-se que mais de 600 mil recém-nascidos morrem a cada ano de infeções graves, e que a maioria dessas mortes poderia ser evitada por medidas preventivas, cuidados atempados, tratamento antibacteriano apropriado e acompanhamento, pois sabe-se que cerca de 10 por cento deles desenvolvem sinais de Possível Infeção Bacteriana Grave (PSBI) e requerem antibióticos.
Para efeito de classificação da PSBI – síndrome clínica usada no protocolo das Doenças da Infância –, em bebés, desde o nascimento até aos 60 dias de idade, a doença é considerada muito grave quando um ou mais dos seguintes sinais está presente: observada incapacidade de se alimentar desde o nascimento, convulsões, respiração rápida (mais de 60 respirações por minuto), contração torácica grave, febre (38°C ou superior), temperatura corporal baixa (menos de 35,5°C). A OMS recomenda que todos os países devem tratar esta doença, encaminhando as crianças para hospitais especializados, onde poderão ser adequadamente medicadas, porém muitos bebés acabam por não ter acesso a tratamentos atempados, acabando por morrer. Mesmo quando encaminhadas pelas famílias com acesso a hospitais, as crianças muitas vezes já moribundas e sem qualquer tratamento, são recebidas em unidades que carecem de equipamento e dos medicamentos necessários para cuidar de crianças, razão por que a mortalidade em recém-nascidos e bebés permanece assustadoramente elevada em grande parte dos países em desenvolvimento.
Doenças caraterísticas dos infantários
Os estabelecimentos que dão assistência em idade pré-escolar fora do domicílio são reconhecidos como ambientes propícios à transmissão de doenças epidemiológicas especiais por abrigarem populações com um perfil caraterístico e sob risco de contágio às crianças que recebem assistência de forma coletiva.
Caraterísticas comuns como levar as mãos e objetos à boca, contacto interpessoal muito próximo, incontinência fecal na fase mais precoce de controle, ausência da prática de hábitos higiénicos e necessidade de contacto físico constante com os adultos, além da imaturidade do sistema imunológico e a disfunção da trompa de Eustáquio nas infeções virais das vias aéreas superiores, predispõem à otite média aguda (OMA), uma das mais frequentes doenças na infância.
Geralmente, o risco de um agente infecioso ser introduzido em estabelecimento infantil, está diretamente relacionado com a sua prevalência na população da área em que se insere e com o número de indivíduos suscetíveis presentes na instituição.
É sabido que as crianças mais pequenas são frequentemente portadoras assintomáticas de várias doenças, servindo de reservatórios comunitários de agentes infeciosos, tornando-se assim focos de multiplicação de casos de doenças transmissíveis e da sua disseminação para a comunidade circundante, em particular quando aglomeradas em espaços restritos.
De entre as doenças de risco aumentado entre as crianças que frequentam centros infantis, destacam-se as infeções respiratórias, doença diarreica, OMA, doença bacteriana por haemophilus influenzae e streptococcus pneumoniae,hepatite A, varicela-zoster e infeções por citomegalovírus (CMV). Além disso, as crianças portadoras de doenças pulmonares crónicas, cardiopatias congénitas e outras do foro imunológico apresentam igualmente aumentado de complicações infeciosas graves.
As infeções respiratórias das vias aéreas superiores, como constipações, faringites e sinusites ou inferiores como bronquites, bronquiolites e pneumonias, a que se juntam as otites, são responsáveis pela grande maioria das doenças infeciosas que ocorrem em creches e infantários, sendo a causa mais comum de doença infantil na população em geral.
A otite média é uma das infeções bacterianas mais comuns da infância, sendo responsável por sérios problemas médicos, económicos e sociais e fonte de muitas preocupações de pais e educadores. Afeta mais de 50 por cento das crianças no primeiro ano de vida, cerca de 10 por cento terão mais de três episódios e ao atingirem os 3 anos de idade, 70 por cento terão tido pelo menos um episódio da doença. Se não for diagnosticada e tratada atempadamente, podem surgir complicações e levar à perda da acuidade auditiva e dificuldades no desenvolvimento da fala.
A doença diarreica aguda e as mortes que lhe estão associadas, ocorrem maioritariamente nos países em desenvolvimento, em crianças menores de 5 anos, constituindo um problema relevante nas creches, onde pode surgir em casos esporádicos ou surtos. A transmissão é feita por contacto direto ou indireto por vetores passivos ou ingestão de água ou alimentos contaminados, por ausência de práticas de higiene ainda não aprendidas pelas crianças de tenra idade. A incidência de doenças diarreicas em crianças menores de 3 anos de idade que frequentam infantários é aumentada em cerca de 30 a 50 por cento e o ingresso recente nessas unidades está associado a um risco ainda maior.
Em crianças e adultos com o sistema imunológico normal, dificilmente a infeção por citomegalovírus (CMV) resulta em quadro sintomático, no entanto, produz quadros graves no feto e em indivíduos imunocomprometidos. A aquisição desta patologia ocorre geralmente na infância em populações em que a maioria das mulheres é seropositiva, através do aleitamento materno, parto e gestação ou ainda por contacto com outras crianças sendo, contudo, mais comum nos países em desenvolvimento e em camadas mais desfavorecidas nos países desenvolvidos.
Considerando a importância das doenças infeciosas como causa de morbilidade e mortalidade na infância, da utilização crescente dos serviços das creches e infantários pela população infantil e da evidência do aumento de risco para aquisição de doenças, são fundamentais medidas eficazes de prevenção e controle da transmissão de doença nesses ambientes, por forma a reduzir os problemas de saúde entre as crianças e a eventual disseminação do quadro infecioso pela comunidade.
O treino de colaboradores, a interação com profissionais de saúde qualificados, a orientação dos pais e o envolvimento de todos os demais intervenientes no apoio das crianças, são necessários e essenciais para a manutenção de bons programas de prevenção e controle de infeções.
Definir prioridades e organizar tarefas e compromissos evitando sobrecargas, estabelecendo limites de tempo de trabalho e negociando horários flexíveis, ao mesmo tempo que cuidamos do bem-estar mental...
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