Quando se pensa num aquário, provavelmente imaginamos um ou vários peixes coloridos, de diferentes espécies, nadando tranquilamente, por entre algumas plantas que, além de embelezarem o espaço, transmitem uma sensação de tranquilidade e calma, cada vez mais apreciadas.
Contudo, ao contrário do que a maioria das pessoas pensa, um aquário não é somente uma caixa de vidro cheia de água com peixes coloridos: aliás, há mesmo aquários com muito poucos peixes, cujo objetivo é a aplicação de conceitos de estética e arte através das plantas e outros elementos – os aquários plantados –, uma habilidade que é denominada Aquascaping ou Aquapaisagismo.
Esta forma de expressão artística surgiu com a evolução tecnológica paralelamente na Europa e Ásia em meados do século XX segundo duas escolas muito diferentes na aplicação da arte.
Na Europa, especialmente na Holanda e Alemanha, entre os aquários plantados predominavam jardins subaquáticos, domados pela mão do aquarista como se de um canteiro de flores se tratasse, estando as plantas dispostas em grupos organizados pelo aquário em função da cor, velocidade de crescimento e tamanho de folha, predominando as plantas de caule com crescimento rápido. Devido à sua origem e pelo facto de esse país ser conhecido pelos belos jardins, este estilo acabou por ser designado como aquário holandês.
Na Ásia, particularmente no Japão, surgia um estilo oposto, baseado na observação da natureza pelo seu autor e transposição da imagem por si observada para o interior do aquário. Designado de um modo generalista por aquário natural ou simplesmente "nature" esta corrente englobava vários estilos em função do tipo de materiais ou plantas utilizado.
Alguns exemplos destes estilos são o Iwagumi e o Ryoboku, ambos amplamente divulgados pela mão de um dos principais impulsionadores do estilo "nature", o fotógrafo e aquapaisagista Takashi Amano. Em contraste com o estilo holandês no estilo "nature" predominavam plantas de crescimento lento como as de tapete, musgos e fetos.
As diferenças entre estas duas correntes originais ainda hoje são notórias. No entanto, tem-se vindo a caminhar gradualmente para uma mistura das duas com o surgimento de novos estilos que combinam caraterísticas de ambas as vertentes.
Muito mais recentemente, a partir do final do século XX despontou uma nova corrente, de origem especialmente ocidental mas também difundida pelo oriente, baseada na observação e representação de paisagens terrestres submersas no aquário e que tem um ótimo exemplo no português Filipe Oliveira com o seu "Syrah".
Hoje em dia o aquapaisagismo está bem disseminado em praticamente todos os países desenvolvidos onde o acesso ao equipamento necessário é cada vez mais fácil, tendo na internet um dos principais motores de desenvolvimento.
Outro dos veículos de desenvolvimento são os concursos de aquapaisagismo, dos quais o mais importante é o International Aquatic Plant Layout Contest (IAPLC) organizado anualmente pela Aqua Design Amano (ADA).
O aquasacaping apresenta-se, assim, como uma vertente da aquariofilia que explora o lado mais criativo dos seus intervenientes, e que tem apresentado grande desenvolvimento nos últimos anos.
Porém, no que toca à criatividade, apesar de ser o estilo mais antigo de aquapaisagismo, o Aquário Holandês continua a dar que falar pois é um dos mais difíceis em termos de domínio de layout.
O aquário Holandês e as diferenças entre os estilos
Revelado no início do século XX, dá-se o nome de aquário Holandês aos aquários plantados onde cada cm2 é pensado como um todo, e cada planta tem o sítio certo de forma a reproduzir um verdadeiro jardim. Este tipo de aquários necessita de muito estudo, sendo considerado o expoente máximo do aquapaisagismo.
Especialmente dedicados à flora aquática (mais de 80 por cento do aquário fica ocupado pela vegetação), são equipamentos que com frequência contêm apenas algumas espécies de peixe, uma vez que as plantas são o principal atrativo. Os acessórios técnicos estão bem dissimulados e a iluminação é aqui especialmente importante, de forma a conseguir dar a relevância estética que se pretende do aquário.
Algumas das características mais marcantes deste layout são o facto de ser utilizada uma grande variedade de plantas, de cores e texturas diferentes, o que torna necessário que o aquário tenha grandes dimensões. Ainda assim, as plantas estão muito organizadas e podadas, formando moitas muito bem definidas, e sempre limitadas no seu espaço.
Neste estilo, tanto o substrato quanto o vidro do fundo devem estar totalmente encobertos pela flora (normalmente plantas carpetes), e o vidro do fundo fechado com plantas altas de caule, não devendo a copa das mudas ultrapassar a altura da superfície da água. O uso de pedras e troncos é feito apenas para fixação de algumas plantas, e quando utilizados, esses materiais devem ser escondidos por uma outra planta mais baixa, de maneira a ficarem invisíveis.
É, por isso, uma montagem com alguma complexidade, dado que o aquarista deve conhecer as caraterísticas de cada uma das espécies a plantar e respetivas taxa de crescimento, para as poder plantar no local certo e realizar as podas na altura mais apropriada.
Já o estilo "nature" é inspirado na natureza e procura imitar cenários naturais no interior do aquário, tornando-se fundamental a utilização de rochas e troncos para o sucesso de uma montagem nesse estilo.
O estilo Iwagumi, já mencionado, inspira-se nas formações rochosas encontradas em templos japoneses. São utilizadas somente pedras e em geral plantas carpete na montagem. Um dos pilares desse estilo é agrupar um número ímpar de pedras, onde haverá uma pedra principal – sempre a maior do arranjo. As outras são dispostas em função dessa pedra base.
Tal como no Iwagumi, o estilo Ryoboku, também deriva dos jardins japoneses, mas o foco do estilo está nos troncos e galhos. Cenários como o leito de um rio com raízes, troncos cobertos de musgo e manguezais são bem refletidos nesse estilo.
No layout Wabi-kusa o tanque geralmente não está completamente cheio e as plantas utilizadas acabam por ficar parte submersas e parte emersas. Baseia-se na originalidade inerente da natureza e não segue regras humanas. O aparente caos da mistura de espécies transmite a leveza e simplicidade encontradas na natureza.
Agora que já esteve em contacto com os diferentes tipos de aquário, e já sabe que não são só para peixes, já pode começar a criar uma paisagem viva, um pequeno jardim subaquático que se altera diariamente, para embelezar a sua casa e relaxar ao suave ondular das plantas. Para ganhar gosto pode começar mesmo pelo estilo Holandês, o mais antigo.
Montar um aquário Holandês
Antes de mais há que ter em mente que ao tratar de seres vivos, peixes ou plantas, lhe devemos providenciar todos os meios para a sua sobrevivência de forma digna, e que embora na natureza tudo seja tão "simples", a sua reprodução numa "caixa de vidro" às vezes pode tornar-se complexa, tudo pela enorme vontade do ser humano de complicar as coisas...
O aquário de estilo holandês é bastante peculiar. Para começar, em caso algum a altura do aquário pode ultrapassar os 50 cm, pois acima desta dimensão a luz não é suficiente para penetrar até à base das plantas. Tendo em conta que as lâmpadas fluorescentes de 40 W têm 1,20 m de tamanho padrão comercial, o aquário deve possuir dimensões em torno de 1,30 m de comprimento, 50 cm de altura e cerca de 45 cm de largura/profundidade.
Definido o tamanho, a fase do arranjo do solo é de particular importância para o futuro da plantação. A areia escolhida deve ser de grão médio e não lavada, e evitar-se o uso de quartzite, cujos grãos apresentam arestas que deterioram as raízes. A areia dos rios é perfeita, pois os seus grãos são arredondados, o que impede a deterioração das raízes durante a fase da plantação e durante o seu crescimento.
Deve colocar-se uma camada de cerca de 15 cm de areia molhada no fundo do aquário. A seguir, espalhar por cima pedacinhos de turfa fervida, que deve ser esmigalhada de modo grosseiro, formando uma camada de alguns centímetros de altura, que servirá como suporte e fixação das raízes.
Normalmente adiciona-se ainda uma argila fina rica em sais minerais (ferro e cálcio, entre outros), que tem um papel muito importante devido à sua propriedade de fixar os oligoelementos indispensáveis à nutrição das plantas.
A areia, a turfa e a argila devem ser misturadas cuidadosamente de modo a obter-se uma repartição homogénea dos elementos constituintes do solo definitivo. O solo varia de espessura, formando um declive (que irá variar entre uma espessura maior, 15 cm na parte posterior do aquário, e uma espessura menor, ao nível do vidro frontal).
Estando o solo distribuído pelo fundo do aquário, colocam-se algumas rochas vulcânicas, utilizadas devido à sua neutralidade química (pedras de origem granítica, de preferência já bem roladas nos rios, sem arestas perigosas). Esta massa deve ser o mais pequena possível para permitir uma plantação mais densa. Finalmente, e por razões estéticas é espalhada uma camada de alguns centímetros de areia, devidamente lavada, à superfície.
Seguidamente procede-se ao enchimento do aquário com água, sem qualquer particularidade quanto à sua qualidade. Aconselha-se no entanto, uma água macia que não ultrapasse um pH de 7,5 e que deverá ser cuidadosamente vertida sobre uma folha de plástico espalhada sobre o solo, de modo a evitar qualquer perturbação.
Deve ainda ser colocado um termostato e uma ou duas resistências (aquecedores) reguladas para manter uma temperatura de 25º C.
Quanto à localização das plantas, esta não deve ser feita ao acaso mas, cuidadosamente selecionada em função do espaço e local que vai ocupar no aquário, tendo em conta as particularidades de origem botânica das plantas adultas. As plantas deverão ser criteriosamente escolhidas quanto às espécies e quanto ao número, em função das suas formas, cores e tamanho final, de modo a obter-se, após alguns meses, uma harmonia perfeita.
É importante ter em conta a velocidade de crescimento e a altura que atingem as espécies escolhidas de modo a que as massas vegetais fiquem devidamente repartidas, formando um tapete à frente, subindo progressivamente até à parte posterior do aquário e lateralmente.
Para fazer sobressair a decoração vegetal, a parte posterior do aquário pode ser pintada exteriormente com cores sombrias (preto ou verde escuro). O obscurecimento do aquário constitui um artifício ótico em que a profundidade, observando-se o aquário a uma certa distância, aparenta ser acrescida de um terço. Regra geral, a superfície do solo do aquário standard Holandês está dividida em setores retangulares: 3 em profundidade e 3 a 4 em comprimento, dependendo do seu tamanho.
A plantação deve começar sempre pelas plantas solitárias (as de maior porte, que se plantam isoladas, como as Aponogeton e algumas Echinodorus) que ocuparão, com um exemplar apenas, um volume suficiente para que se tornem decorativas assim que atinjam o seu máximo crescimento. Isto é válido para as Amazonas e as Nuphars, por exemplo.
Após a fixação das plantas solitárias, as outras plantas devem ser colocadas em maciços (plantas de grupo, como as Limnophila, Hygrophila e Sagittaria), espaçando os pés segundo o diâmetro que atingirá a coroa de folhas superiores da planta adulta. Assim, as Valisnérias que se desenvolvem em forma de pincel estreito serão muito comprimidas enquanto que as Cryptocoryne, Lobélia cardinalis e Heteranthera deverão estar mais espaçadas entre elas. Esta plantação em maciços deverá ser feita a partir do centro para a periferia, e da frente para a parte posterior do aquário.
Toda a plantação deve ser feita à mão, utilizando como guia o polegar esticado, permitindo deste modo enterrar as raízes no solo o mais verticalmente possível e sem a formação de novelos.
Para além da riqueza vegetal, imagina-se sempre que quando se fala no aquário holandês este praticamente não tem peixes. É evidente que não se pode introduzir nestes jardins aquáticos animais fitófagos (peixes devoradores de plantas) ou escavadores. No entanto, a presença destes animais é indispensável, não apenas pela estética mas também pelo equilíbrio biológico.
As espécies e o número de peixes introduzidos são devidamente calculados para associar a estética às necessidades biológicas. Encontram-se frequentemente, nestes aquários, Platys e Mollys pretas, devido ao facto de se alimentarem de algas microscópicas, sem tocarem nas plantas. A preferência recai ainda nos Caracídeos que possuem um comportamento perfeitamente neutro e nos peixes de fundo não-escavadores de pequeno tamanho, como os Corydoras, que asseguram uma limpeza eficiente mas delicada do fundo.
É, no entanto, necessário que o número de peixes seja limitado, sobretudo devido ao facto de não se usarem difusores de ar.
E não se assuste com as algas, pois não constituem um problema significativo. Poder-se-á limitar a sua proliferação reduzindo-se o tempo de iluminação, um dos cuidados que faz parte da manutenção do aquário.
A manutenção do aquário
A potência e a natureza da iluminação são fatores dos quais vão depender a fotossíntese e a assimilação energética das folhas. A duração quotidiana da iluminação é um dos fatores mais importantes do aquário. Será reduzida de 2 a 3 horas, no verão, em função da adaptação das plantas aos ritmos biológicos sazonais mesmo que o aquário se situe numa assoalhada sombria da casa.
Em confronto com o aquário de estilo "nature", o Holandês é mais difícil de manter uma vez que cada planta se comporta de forma específica. Algumas plantas crescem mais rapidamente do que outras, tornando necessário apará-las com frequência de maneira a manter a forma do layout.
Os cuidados a ter com as plantas ao longo dos meses e anos de funcionamento neste tipo de aquário devem ser frequentes. Em média, ocupam entre 2 a 4 horas por semana consoante o tamanho do aquário e consistem, essencialmente, em corrigir o tamanho da planta e efetuar a transplantação, sempre que for necessário. Logo que o crescimento se torne demasiado importante e prejudique a tão pretendida estética, as plantas deverão ser podadas.
Este trabalho será tanto ou quanto mais frequente consoante a proximidade do vidro frontal. Existe uma maior tolerância para com as plantas laterais para o qual se admite que algumas possam atingir a superfície sem a invadirem excessivamente.
Sempre que uma variedade de planta não se adapte ao aquário (após várias tentativas), o melhor é optar por outra espécie. A experiência mostra-nos que o falhanço será sempre reincidente.
Estes são apenas alguns dos cuidados básicos deste tipo de aquário, mas para o transformar num jardim paradisíaco, e numa obra de arte floral, é necessário ter prazer no que faz e ser persistente. Não desanime diante do primeiro fracasso… e boa sorte!
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