Devido às transformações sociais que se têm vindo a observar nas últimas décadas, designadamente ao nível da estrutura familiar, que por força do envelhecimento progressivo da população, da redução da natalidade e outros fatores conexos, têm fragmentado o núcleo tradicional da família, isolando fisicamente os seus membros, um crescente número de pessoas idosas e doentes crónicos passaram a viver em solidão.
O ser humano não pode nem sabe viver isolado dos seus semelhantes, em particular nas últimas etapas de vida ou sempre que necessite de assistência na doença, seja ela crónica ou de qualquer outra etiologia, quando se prolonga no tempo, e as estruturas nacionais de saúde não estão vocacionadas para prestar esse tipo de ajuda de forma continuada.
Privadas da sua autonomia e independência, por força da idade ou doença, as pessoas ficam extremamente fragilizadas por não serem capazes de realizar as atividades básicas da vida quotidiana, em tarefas tão simples como cuidar do corpo, da higiene ou dos cuidados domésticos, o que provoca um enorme impacto social, psicológico, físico e funcional nas suas vidas, perturbando gravemente o seu bem-estar.
Face a este panorama, com o número de idosos, acamados e doentes crónicos a aumentar exponencialmente, a sociedade começou a manifestar-se no sentido da criação de uma estrutura de apoio a essas pessoas, assente essencialmente nos elementos familiares mais próximos, que com o suporte do estado e segundo regras muito específicas pudesse coadjuvar os serviços da Segurança Social nessa tarefa.
Surgiu assim a figura do cuidador informal, cujo estatuto foi aprovado em setembro de 2019 pela Lei nº 100/2019, posteriormente regulamentado pela portaria nº2/2020 de 6 de janeiro de 2020, que para além de definir o perfil da pessoa cuidada, prevê a figura do cuidador informal principal e do cuidador informal não principal. Além disso, estabelece ainda que o cuidador informal beneficiário da eventualidade de desemprego é equiparado ao cuidador informal que exerça atividade profissional remunerada.
O Estatuto do cuidador informal explicita, entre outras medidas, um subsídio de apoio aos cuidadores, o descanso a que têm direito e medidas específicas relativamente à sua carreira contributiva.
Determina aquele estatuto que o cuidador informal só pode ser reconhecido nessa qualidade, se reunir cumulativamente os seguintes requisitos:
– ser residente em Portugal;
– ter mais de 18 anos;
– reunir condições físicas e psicológicas adequadas aos cuidados a serem prestados;
– ser cônjuge ou unido de facto, parente ou afim até ao 4.º grau da linha reta ou da linha colateral da pessoa cuidada.
Para além destes requisitos de natureza genérica, o cuidador informal deverá também preencher as seguintes condições:
– viver em comunhão de habitação com a pessoa cuidada;
– prestar cuidados permanentemente;
– não exercer qualquer outra atividade profissional remunerada ou qualquer outra atividade incompatível com a prestação de cuidados de forma continuada;
– não ser beneficiário de prestações de desemprego;
– não auferir remuneração pelos cuidados que presta à pessoa cuidada.
Estabelece ainda que o cuidador informal pode ser um trabalhador-estudante, desde que não exerça atividade principal e frequente oferta de educação ou de formação profissional e além disso pode ser considerado como cuidador principal ou cuidador não principal.
É considerado cuidador principal aquele que cumulativamente viva em comunhão de habitação com a pessoa cuidada, preste cuidados de forma permanente, não exerça atividade profissional remunerada ou outro tipo de atividade incompatível com a função a exercer, não receba prestações de desemprego e não receba remuneração pelos cuidados que presta à pessoa cuidada.
O cuidador não principal, é o que acompanha e cuida da pessoa cuidada de forma regular, mas não permanente, podendo ou não receber remuneração de atividade profissional ou pelos cuidados que presta à pessoa cuidada.
Desde julho de 2020 que os candidatos que reúnam os requisitos exigidos, podem apresentar os pedidos de reconhecimento do estatuto de cuidador informal em todo o território nacional, bastando para isso dirigir um requerimento aos serviços da Segurança Social ou através do portal da Segurança Social Direta, em requerimento próprio, que deverá obter resposta no prazo de 60 dias, devendo simultaneamente ser manifestada a vontade inequívoca da pessoa a ser cuidada.
Depois de reconhecido o estatuto, é emitido um Cartão de Identificação de cuidador informal.
Por sua vez, para efeito de reconhecimento do estatuto de cuidador informal, a pessoa cuidada tem que reunir as seguintes condições:
– estar numa situação de dependência de terceiros e necessitar de cuidados permanentes;
– não se encontrar acolhida em resposta social ou de saúde pública ou privada, em regime residencial;
– ser titular de uma das seguintes prestações sociais: complemento por dependência de 2º grau; complemento por dependência de 1º grau, se transitoriamente se encontrar acamada ou a necessitar de cuidados permanentes, por estar em situação de dependência, mediante avaliação específica dos Serviços de Incapacidades do Instituto da Segurança Social;
– subsídio por assistência de terceira pessoa.
Cessação do reconhecimento
O reconhecimento do estatuto de cuidador informal cessa nas seguintes situações: cessação de residência da pessoa cuidada ou do cuidador no país; no caso de cuidador informal principal, a cessação da vivência em comunhão de habitação entre a pessoa cuidada e o cuidador; incapacidade permanente e definitiva, ou dependência, do cuidador; por morte da pessoa cuidada ou do cuidador; pela não observância dos deveres do cuidador informal, mediante informação fundamentada por profissionais da área da segurança social ou da área da saúde; cessação da verificação das condições que determinaram o reconhecimento ou a sua manutenção.
Medidas de apoio, direitos e obrigações
A pessoa cuidada tem direito a ver preservado o seu bem-estar global físico, mental e social, incluindo acompanhamento pelo cuidador informal nos atos médicos; reserva da sua privacidade; participação ativa na vida familiar e comunitária sempre que possível; ser ouvida e manifestar a sua vontade em relação à convivência e à prestação de cuidados pelo cuidador informal; socializar e aceder a atividades ocupacionais, sempre que possível; proteção na situações de descriminação, negligência e violência; garantia de medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão, quando se trate de menores, entre outros.
Em contrapartida, a pessoa cuidada tem o dever de participar e colaborar no seu processo terapêutico, tendo em conta as suas capacidades, incluindo o plano de cuidados que lhe são dirigidos.
Por outro lado, o cuidador informal, pode beneficiar de medidas de apoio como, manter um contacto profissional de saúde de referência em função das necessidades de saúde da pessoa cuidada; aconselhamento, capacitação e formação por profissionais da saúde no âmbito de planos de intervenção específicos; participação em grupos de autoajuda para minimizar o isolamento; formação específica por profissionais da área da saúde em função das necessidades da pessoa cuidada; aconselhamento e acompanhamento por profissionais da segurança social no âmbito do atendimento direto de ação social; informação e encaminhamento para redes sociais de suporte, incentivando os cuidados de apoio domiciliário.
Mediante condições, o cuidador informal pode beneficiar de um subsídio de apoio a atribuir pelo subsistema de solidariedade social, gozar de benefícios fiscais e ter acesso ao regime de seguro social voluntário, além da promoção da integração no mercado de trabalho, findos os cuidados prestados à pessoa cuidada. O cuidador informal que tenha uma atividade profissional, pode ainda beneficiar de medidas que promovam a conciliação entre o trabalho e a prestação de cuidados, nos termos da lei, medida que é extensiva ao cuidador informal não principal, sendo que neste caso haverá lugar a registo adicional de remunerações, mediante comunicação do facto à instituição de segurança social, pelo trabalhador.
Nestes tempos de pandemia, muitas pessoas tornaram-se subitamente cuidadores informais prestando ajuda voluntária a outra pessoa, seja no contacto físico, na gestão e no apoio emocional durante um período de doença ou incapacidade, quer tenha sido na higiene e cuidados de saúde básicos, alimentação, adesão à terapêutica, compras e idas à farmácia realizadas em períodos de isolamento.
Cuidar de um familiar ou amigo, pode ser muito gratificante, mas também pode causar dor, cansaço, medo e perda. De forma presencial ou virtual, direta ou indiretamente, todos podemos cuidar e ajudar, mas para isso recomenda-se que caso venha a assumir o papel de cuidador informal aprenda primeiro a cuidar de si próprio, começando em primeiro lugar por seguir todas as regras de proteção recomendadas pelas entidades da saúde aliadas ao bom senso.
Definir prioridades e organizar tarefas e compromissos evitando sobrecargas, estabelecendo limites de tempo de trabalho e negociando horários flexíveis, ao mesmo tempo que cuidamos do bem-estar mental...
A vacinação continua a ser o melhor meio de proteção contra o vírus, com uma proteção mais eficaz contra doenças mais graves, embora o seu efeito protetor diminua com o passar do tempo.