O conceito geral de hospital tem a sua origem no vocábulo latino hospes (hóspede ou hospedeiro) do qual resulta hospitalitas (hospitalidade), noção que ao longo do tempo passou a dizer respeito à qualidade de hospedar ou acolher alguém de forma agradável e com prazer. Porém, no decurso do século XV, em boa parte devido à intervenção das ordens religiosas no apoio social às populações na Europa, o sentido começou a mudar para “lugar onde são recolhidos velhos, pobres e doentes, asilo”, conceito que no século seguinte se consolidou com o sentido atual de “edifício onde permanecem pessoas doentes para receberem cuidados e tratamento”.
Segundo a definição oficial, hospital é hoje um estabelecimento de saúde com serviços diferenciados, dotado de capacidade de internamento, de ambulatório (consulta e urgência) e de meios de diagnóstico e terapêutica, com o objectivo de prestar à população assistência médica curativa e de reabilitação, competindo-lhe também colaborar na prevenção da doença, no ensino e na investigação científica.
Consequentemente, a estrutura dos hospitais foi idealizada por forma a cumprir as funções de prevenção, diagnóstico e tratamento de doenças. Contudo, grande parte dos hospitais modernos regem-se por uma modalidade conhecida como cuidados progressivos, em que não há salas divididas por especialidades médicas, mas antes onde os tratamentos são prestados progressivamente ao paciente de acordo com a sua gravidade e complexidade.
No interior de um hospital coexistem o sistema assistencial de atendimento direto ao paciente por parte dos profissionais da equipa médica de serviço, o sistema administrativo e contabilístico e o sistema de gestão, tornando a unidade praticamente autónoma em termos de segurança e prestação serviços de saúde para os quais foi criada.
Paradoxalmente, as unidades hospitalares foram desde sempre um problema de saúde pública, muito embora a sua natureza aponte para o contrário e aí cumprirem o seu papel. Contudo há aspetos contraditórios e pouco claros que durante muitas décadas nos impediram de ver a dimensão e a gravidade do que se passava no interior desses espaços, públicos ou privados, mais concretamente o aparecimento e proliferação de infeções hospitalares que por vezes levavam a desfechos fatais.
Atualmente, já é possível ter uma perspetiva mais rigorosa e, sobretudo, comparar situações distintas entre os vários países, que mostram como a realidade ainda é assustadora, não obstante a implementações de cada vez mais medidas tendentes a eliminar os potenciais focos de infeção nos hospitais e outros locais de atendimento de doentes.
Segundo um relatório oficial publicado em 2016 pela Direção-Geral de Saúde (DGS), em que pela primeira vez se destaca a mortalidade, as mortes associadas a infeções contraídas durante os internamentos nos hospitais são em média sete vezes superiores às causadas por acidentes de viação, referindo também que em 2013 ocorreram 4600 casos, com mais de 12 mortes por dia, estatisticamente equivalente a um em cada dez infectados. Face aos resultados revelados, o Ministério da Saúde anunciou uma série de medidas com vista à redução das taxas de infeção designadamente incentivos financeiros para os hospitais que o consigam fazer.
O conceito de infeção hospitalar inclui todo e qualquer processo infeccioso, não identificado na admissão do paciente que se manifeste durante a sua permanência e, em casos específicos, até mesmo depois de sua alta do hospital.
Tendo em vista que este não é um problema exclusivamente português, e tendo por objetivo reduzir a sua dimensão, colocando o país dentro da média do ranking europeu nesta matéria, foram criadas metodologias organizacionais para analisar as instalações de cada unidade hospitalar, por forma a coordenar as ações a tomar e torná-las mais eficazes.
Um hospital é um amplo local de reunião para onde convergem doentes com as mais variadas patologias e pessoas saudáveis seus acompanhantes, para além dos profissionais de saúde que ali trabalham e onde permanecem durante uma boa parte de suas vidas, funcionando assim como um pequeno universo onde bactérias, vírus e muitos outros microrganismos podem ser facilmente transmitidos de pessoa para pessoa.
Frequentemente temos notícias de casos de infeções adquiridas durante o internamento hospitalar, ou mesmo após a alta, não somente entre os chamados pacientes de risco, mas também entre pessoas aparentemente saudáveis. Além de crianças, com o sistema imunológico ainda em desenvolvimento, são considerados pacientes de risco os idosos, portadores de diabetes, pacientes com o sistema imunológico deprimido, os que usaram doses elevadas de antibacterianos ou durante longos períodos de tempo, os que foram submetidos a procedimentos invasivos como cirurgia, colocação de sondas, cateteres, entubação e outras operações similares.
De uma maneira geral todas as infeções, incluindo as hospitalares, podem ser reduzidas drasticamente se todas as pessoas puserem em prática um hábito muito simples de higiene, que consiste na lavagem das mãos. Por parte dos profissionais de saúde, a higiene das mãos é a medida mais eficaz, mais simples e económica de prevenir as Infeções Associadas aos Cuidados de Saúde (IACS), prática a que a maioria das unidades de saúde do nosso país tem vindo a aderir, assegurando a sua monitorização.
Se para os profissionais de saúde, além de outras práticas de segurança, estas medidas elementares de higiene devem ser regra, pois lidam com todos, também esse hábito deverá ser sistematicamente observado pelas visitas, familiares dos doentes e acompanhantes, que devem ter o cuidado de lavar bem as mãos para não servirem de veículos dos agentes de contaminação.
De acordo com a OMS, as infeções hospitalares são o efeito adverso mais frequente na prestação de cuidados de saúde, sendo que centenas de milhões de pessoas sofrem com estas infeções, todos os anos.
Equipamentos hospitalares
A recente ocorrência de contaminações pela Doença do Legionários (Legionella), em duas unidades hospitalares, e antes em uma unidade industrial, puseram a descoberto algumas fragilidades nos equipamentos de conforto, como instalações e sistemas de aquecimento, ar condicionado e águas, em que ficou demonstrada a importância da manutenção regular, onde não poderá existir desinvestimento, sob qualquer pretexto.
A doença, uma pneumonia rara que exige métodos de diagnóstico específicos, é provocada por microrganismos que se desenvolvem em reservatórios de água doce natural como rios e lagos, mas também em reservatórios artificias que alimentam as torres de arrefecimento dos sistemas de condicionamento de ar em unidades industriais e hospitais e se propaga através de gotículas de água em suspensão. É também comum as bactérias desenvolverem-se em equipamentos que facilitam a libertação de aerossóis como humidificadores, piscinas, instalações termais e jacuzzis, através dos quais se faz o contágio.
A legionella ataca sobretudo as pessoas com o sistema imunitário debilitado, em particular pessoas com mais de 50 anos, que inalem os aerossóis contendo bactérias com caraterísticas de particular virulência, competindo aos Serviços de Saúde proceder às operações de manutenção necessárias para manter as unidades de saúde livres desse tipo de contaminações.
Contaminação de superfícies
Estudos recentes indicam que uma das principais causas das infeções hospitalares se deve à contaminação das superfícies, designadamente através de equipamento como camas anteriormente ocupadas por pessoas infetadas com certos tipos de microrganismos, daí resultando a necessidade urgente de melhorar os aspetos desinfeção ambiental no interior dos hospitais e outras unidades de internamento, a par da higienização das mãos, uso de vestuário de proteção e isolamento dos doentes em risco.
A prevenção e combate às infeções associadas aos cuidados de saúde, deve constituir uma prioridade, incorporando todos os outros fatores contaminantes referidos e seguindo sempre as boas práticas terapêuticas recomendadas pela DGS, nomeadamente no que se refere à prescrição de antibióticos, com particular incidência nas quinolonas que tudo destroem sem critério, a fim de reduzir as resistências bacterianas, um problema grave em Portugal.
Apesar de mais de um terço das infeções associadas aos cuidados de saúde serem evitáveis, a sua taxa no nosso país ainda ultrapassa os 10 por cento, o que equivale ao dobro da média europeia, tornando-se por isso de extrema importância que sejam implementadas medidas preventivas em substituição das medidas corretivas usadas, o que passa por pôr em prática procedimentos de formação para todos os profissionais de saúde, em que sejam abordadas técnicas de descontaminação de espaços problemáticos.
Novas tecnologias com sistemas autónomos de desinfeção de quartos, têm provado a sua eficácia na redução drástica de dependência dos auxiliares e têm por isso potencial para melhorar a eficácia da higienização geral. Para além destas opções, estão hoje disponíveis no mercado novos métodos de biodescontaminação que atenuam o elevado risco de infeção deixado pelos ocupantes anteriores, como radiações ultravioletas e vapores de peróxido de hidrogénio ou em aerossol.
Através desses métodos, muitas complicações associadas às infeções hospitalares, bem como muitas mortes, podem ser evitadas em Portugal.
Finalmente, o cidadão, como utente potencial dos cuidados de saúde nos hospitais e figura central do sistema de saúde, tem direito a ser tratado no respeito pela dignidade humana, mas tem igualmente por dever zelar pelo seu estado de saúde procurando garantir o seu restabelecimento e participar na promoção da própria saúde e da comunidade em que vive, o que implica seguir as boas regras de higienização, quer na qualidade de utente quer de visitante ou acompanhante.